Se, até o início da década de 70, a população brasileira vivia majoritariamente no campo, o intenso êxodo rural ocorrido a partir de então deu às cidades cada vez mais relevância, relegando o meio rural, em alguns sentidos, à condição de coadjuvante.

Como os grandes empreendimentos imobiliários, sejam eles parcelamentos do solo urbano, sejam eles incorporações, são implantados quase exclusivamente no território urbano, o direito imobiliário acaba se concentrando mais na cidade, deixando para o direito agrário a regulação das normas que impactam o imóvel rural.

Isso é, como se verá nos próximos artigos que escreveremos sobre o imóvel rural, um erro, já que, com uma legislação agrária hesitante e muitas vezes engessada por conceitos já ultrapassados, perde-se um enorme potencial de aproveitamento econômico de áreas que, na prática, já não possuem qualquer vocação rural.

Já exploramos, ao estudar a lei de parcelamento do solo, o conceito de imóvel urbano, assim como trouxemos, ainda que de forma muito breve, uma primeira definição do imóvel rural ao examinar a possibilidade de implantação de um condomínio de lotes em área rural.

Hoje, estudaremos mais a fundo o imóvel rural, buscando entender seu conceito, suas principais características, diferenças em relação ao imóvel urbano e cadastros obrigatórios.

Esse é um passo necessário para que se possa compreender, depois, o que pode ser feito, à luz da legislação, no imóvel rural.

Nas próximas semanas, abordaremos as possibilidades de implantação de empreendimentos em tal meio.

O que é um imóvel rural

No universo jurídico “agro”, a primeira e mais importante lei a ser estudada é o Estatuto da Terra (Lei 4.504/64), promulgada durante o regime militar, que regula os direitos e obrigações concernentes aos bens imóveis rurais, para os fins de execução da Reforma Agrária e promoção da Política Agrícola.

Também são relevantes e poderão ser mencionadas e/ou examinadas no desenvolvimento deste artigo:

NormaData de publicaçãoAssunto(s) principal(is)
Decreto nº 55.89108/04/1965Regulamenta alguns pontos do Estatuto da Terra, trazendo bases para a Reforma Agrária e para a Política Agrícola, além de regras de determinação do módulo rural e zoneamento
Lei 4.94711/04/1966Fixa normas de Direito Agrário e dispõe sobre a organização e funcionamento do IBRA (atual INCRA), além de criar o CCIR
Decreto nº 59.56617/11/1966Regulamenta alguns pontos do Estatuto da Terra, notadamente quanto aos contratos agrícolas e o crédito rural
Decreto 59.42830/12/1966Regulamenta alguns pontos do Estatuto da Terra, especialmente quanto à colonização pública e particular, trazendo importante previsão sobre desmembramento de imóvel rural
Lei 5.70911/10/1971Regula a aquisição de imóvel rural por estrangeiro
Lei 5.86814/12/1972Cria o Sistema Nacional de Cadastro Rural (SNCR)
Decreto nº 72.10624/04/1973Regulamenta o SNCR e trata do ITR
Lei 8.17112/03/1991Dispõe sobre a Política Agrícola Nacional
Lei 8.62926/02/1993Regulamenta dispositivos constitucionais relativos à reforma agrária
Lei 9.39320/12/1996Dispõe sobre o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR)
Lei 10.26729/08/2001Altera várias outras leis para, no geral, prever e exigir o georreferenciamento de imóvel rural
Lei 12.65128/05/2012Estabelece o novo Código Florestal, criando o Cadastro Ambiental Rural

Como se percebe com facilidade da análise da tabela acima, o sistema legislativo brasileiro, no que se refere ao imóvel rural, é extremamente complexo, dificultando a compreensão de muitos institutos e a construção de um raciocínio claro.  

Seja como for, o conceito de imóvel rural pode ser primeiro extraído da Lei 4.504/64, mais conhecida como Estatuto da Terra.

Nos termos do seu artigo 4º, inciso I, imóvel rural é “o prédio rústico, de área contínua, qualquer que seja a sua localização, que se destina à exploração extrativa agrícola, pecuária ou agroindustrial, quer através de planos públicos de valorização, quer através de iniciativa privada”.

Em seguida, o Decreto nº 55.891/65, em seu artigo 5º, estende um pouco o conceito para prédio rústico, de área contínua, qualquer que seja a sua localização em perímetros urbanos, suburbanos ou rurais dos municípios, que se destine à exploração extrativa, agrícola, pecuária ou agro-industrial, quer através de planos públicos de valorização, quer através da iniciativa privada.

Já aqui se observa, claramente, a eleição do critério da destinação sobre a da localização para a definição do imóvel rural (trataremos desses critérios mais adiante).

Definição semelhante é encontrada no artigo 93 do Decreto nº 59.428/66:

Imóvel Rural, na forma da lei e de sua regulamentação, é o prédio rústico de área contínua, localizado em perímetro urbano ou rural dos Municípios que se destine à exploração extrativa, agrícola, pecuária ou agroindustrial, através de planos públicos ou particulares de valorização”.

Por fim, a Lei 8.629/93 (artigo 4º, inciso I), que regulamenta os dispositivos constitucionais sobre a reforma agrária, também conceituou o imóvel rural, de forma quase idêntica ao Estatuto da Terra:

Imóvel Rural – o prédio rústico de área contínua, qualquer que seja a sua localização, que se destine ou possa se destinar à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agroindustrial.

Como se vê, o conceito de imóvel rural pode ser desmembrado em 4 elementos constitutivos:

  • Prédio rústico: se refere, basicamente, ao solo não edificado, predominante – mas não exclusivo – em áreas rurais; evoca também a prevalência de elementos naturais, como terra, água, plantações, criações de animais;
  • Área contínua: entende-se “área” como terreno destinado ao uso rústico; entende-se “contínua” como continuidade econômica, e não espacial, ou seja, não importa que exista divisão física ou registral (mais de uma matrícula) no imóvel, desde que haja continuidade na sua utilização (toda a área seja utilizada com um mesmo fim). Isso foi determinado de forma expressa, inclusive, no Ato Declaratório Normativo COSIT nº 9/98, expedido pela Receita Federal;
  • Irrelevância da localização: a lei determina expressamente que a localização do imóvel (se urbana ou rural) não importa para a sua caracterização;
  • Destinação: o imóvel, para ser considerado rural, deve ser destinado a atividades de exploração da terra, como exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agroindustrial.

Conceito Agrário e Conceito civil/registral

É relevante notar, como já adiantado quando analisamos o que significaria “área contínua”, que o conceito de imóvel rural pode ser distinto a depender do uso que se faz dele.

Para os órgãos do Poder Executivo (especialmente INCRA e Receita Federal), é irrelevante o número de proprietários, a quantidade de matrículas ou mesmo a existência de obstáculos físicos entre duas ou mais áreas rurais.

Se houver o exercício, em todas, de uma mesma atividade econômica, todas essas áreas constituirão, para os fins cadastrais e tributários, um único imóvel rural. A isso se dá o nome de unidade de exploração econômica e é exatamente esse fundamento que cunha o conceito agrário do imóvel rural.

Veja-se que, para o INCRA e para a Receita Federal, sequer é relevante se há várias matrículas com proprietários distintos. Se, nas áreas registradas naquelas matrículas, houver uma continuidade econômica, existirá um único imóvel rural.

Por outro lado, como, no sistema registral brasileiro, impera o princípio da unitariedade matricial, pelo qual a cada imóvel deverá corresponder um único registro (transcrição ou matrícula), o conceito registral de imóvel rural não pode ser semelhante ao conceito agrário.

Logo, para fins registrais, o imóvel rural será aquele representado em uma única matrícula, ainda que ele possa fazer parte, junto com outros, de uma unidade de exploração econômica.

O critério da destinação

Um dos elementos constitutivos da definição de imóvel rural, como visto no tópico anterior, é a sua destinação.

Com efeito, todos os dispositivos legais examinados até o momento determinam expressamente que a destinação do imóvel a atividades agrárias, tais como de exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agroindustrial, constituem fator determinante para a caracterização do imóvel rural, independentemente de sua localização.

É possível concluir, portanto, que um imóvel rural pode estar localizado tanto na zona rural quanto na zona urbana de um município.

Porém, existem outras normas que adotam critério diverso para a caracterização do imóvel rural, o que será mais bem explorado a seguir.

O critério da localização

Embora a legislação analisada até este ponto consagre o critério da destinação para definir o imóvel rural, é importante saber que o Código Tributário Nacional, ao regular o imposto sobre esse tipo de propriedade, adota outro critério.

Nos termos do artigo 29 da referida norma, o imposto sobre a propriedade territorial rural “tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de imóvel por natureza, como definido na lei civil, localizado fora da zona urbana do Município”.

Verifica-se, assim, um conflito entre a previsão do CTN e das demais normas ora analisadas, já que, para o Direito Tributário, um dos critérios definidores do imóvel rural é a sua localização fora da zona urbana do município.

Ainda no CTN, é o critério da localização que define, por essência, o imóvel urbano, que, de acordo com o artigo 32, é aquele situado dentro da zona urbana, tal qual definida em lei municipal, e, para fins de incidência do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU), deve, também, atender a pelo menos 2 (dois) melhoramentos indicados nos incisos do §1º da referida norma, a saber:

Art. 32. O imposto, de competência dos Municípios, sobre a propriedade predial e territorial urbana tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município.

§ 1º Para os efeitos deste imposto, entende-se como zona urbana a definida em lei municipal; observado o requisito mínimo da existência de melhoramentos indicados em pelo menos 2 (dois) dos incisos seguintes, construídos ou mantidos pelo Poder Público:

I – meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais;

II – abastecimento de água;

III – sistema de esgotos sanitários;

IV – rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar;

V – escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do imóvel considerado.

Assim, por força da disposição legal, e exclusão, um imóvel só será considerado urbano se estiver dentro na zona urbana, de área de expansão urbana ou de urbanização específica, desde que não tenha destinação agrária.

Adoção majoritária do critério da destinação pela jurisprudência

Em razão do conflito de normas tratado nos itens anteriores, coube à doutrina e à jurisprudência a definição do critério definidor do imóvel rural: a destinação ou a localização.

A discussão foi levada aos tribunais superiores por diversas vezes e de diversas formas.

Em julgamento de ação que versava sobre desapropriação para fins de reforma agrária, o Superior Tribunal de Justiça, ao tratar da definição de imóvel rural, consignou que a sua natureza é, sim, definida pela sua destinação, e não pela localização (REsp 621.680/RJ).

Em outro caso (AR 3.971/GO), também versando sobre desapropriação, o entendimento foi de que apesar de o critério de definição da natureza do imóvel não ser a localização, mas a sua destinação econômica, os Municípios podem, observando a vocação econômica da área, criar zonas urbanas e rurais. Assim, mesmo que determinado imóvel esteja em zona municipal urbana, pode ser, dependendo da sua exploração, classificado como rural.”

O tema chegou a ser objeto de tese firmada em sede de julgamento sob o rito de recursos repetitivos[1], ao qual foi submetido o REsp 1.112.646/SP:

Tema Repetitivo 174

Tese firmada: Não incide IPTU, mas ITR, sobre imóvel localizado na área urbana do Município, desde que comprovadamente utilizado em exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial (art. 15 do DL 57/1966).

Vale destacar, também, o conceito trazido pela Instrução Normativa nº 82 do INCRA, que dispõe sobre o cadastro de imóveis rurais no Sistema Nacional de Cadastro Rural:

Art. 6º. Imóvel rural é a extensão contínua de terras com destinação (efetiva ou potencial) agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agroindustrial, localizada em zona rural ou em perímetro urbano

Como se vê, a posição pacífica, hoje, é de que o critério da destinação será o determinante para a caracterização do imóvel rural, ou seja, é preciso que a finalidade do imóvel seja de exploração agrícola, pecuária ou agroindustrial, independentemente de sua localização.

Em outras palavras, se o imóvel for utilizado para atividades de exploração da terra, ele será considerado rural, mesmo que esteja situado em zona urbana.

Principais diferenças entre imóvel rural e urbano

Se a destinação à produção agrícola, pecuária ou agroindustrial é o que define o imóvel rural, o imóvel urbano, por exclusão, é aquele destinado a atividades que não são de exploração da terra, como moradia e atividades de indústria ou comércio.

Mas, como visto, além de não estar destinado à prática de atividades definidas como rurais, o imóvel, para ser considerado urbano para fins de cobrança do IPTU, ainda precisa se enquadrar nos requisitos indicados no Código Tributário Nacional.

Ao contrário do imóvel rural, todavia, o imóvel não será considerado urbano pelo simples fato de se exercer, nele, uma atividade não rural, ou seja, é o critério da localização, somando à ausência de destinação rural,que define, por excelência, o imóvel urbano.

Por isso, ainda que haja uma alteração do perímetro urbano, o município só poderá obrigar o proprietário do imóvel rural a transformá-lo em urbano se existente, na região, a infraestrutura mínima prevista no CTN.

Até que isso ocorra, será de escolha do proprietário de imóvel rural localizado em área de expansão urbana ou de urbanização específica solicitar a sua conversão em urbano. Se o fizer, todavia, o processo é, até nova alteração, irreversível: passará a pagar IPTU, ao invés do ITR.

Função social do imóvel rural

Enquanto a propriedade urbana cumpre sua função social, segundo o § 2º do artigo 182 da Constituição Federal, quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, ou seja, quando alcança os parâmetros mínimos de ocupação/uso/construção previstos na lei local, do imóvel rural se exige algo bem mais complexo.

A própria Constituição dá a diretriz:

Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:

I – aproveitamento racional e adequado;

II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

Há, como se vê, exigências de natureza econômica (inciso I), ambiental (inciso II) e laboral (incisos III e IV).

Regulamentando a Constituição, a Lei 8.629/93 destrincha melhor o requisito econômico:

Art. 6º Considera-se propriedade produtiva aquela que, explorada econômica e racionalmente, atinge, simultaneamente, graus de utilização da terra e de eficiência na exploração, segundo índices fixados pelo órgão federal competente.

§ 1º O grau de utilização da terra, para efeito do caput deste artigo, deverá ser igual ou superior a 80% (oitenta por cento), calculado pela relação percentual entre a área efetivamente utilizada e a área aproveitável total do imóvel.

§ 2º O grau de eficiência na exploração da terra deverá ser igual ou superior a 100% (cem por cento), e será obtido de acordo com a seguinte sistemática:

I – para os produtos vegetais, divide-se a quantidade colhida de cada produto pelos respectivos índices de rendimento estabelecidos pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea;

II – para a exploração pecuária, divide-se o número total de Unidades Animais (UA) do rebanho, pelo índice de lotação estabelecido pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea;

III – a soma dos resultados obtidos na forma dos incisos I e II deste artigo, dividida pela área efetivamente utilizada e multiplicada por 100 (cem), determina o grau de eficiência na exploração.

§ 3º Considera-se efetivamente utilizadas:

I – as áreas plantadas com produtos vegetais;

II – as áreas de pastagens nativas e plantadas, observado o índice de lotação por zona de pecuária, fixado pelo Poder Executivo;

III – as áreas de exploração extrativa vegetal ou florestal, observados os índices de rendimento estabelecidos pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea, e a legislação ambiental;

IV – as áreas de exploração de florestas nativas, de acordo com plano de exploração e nas condições estabelecidas pelo órgão federal competente;

V – as áreas sob processos técnicos de formação ou recuperação de pastagens ou de culturas permanentes;

VI – as áreas sob processos técnicos de formação ou recuperação de pastagens ou de culturas permanentes, tecnicamente conduzidas e devidamente comprovadas, mediante documentação e Anotação de Responsabilidade Técnica.

§ 4º No caso de consórcio ou intercalação de culturas, considera-se efetivamente utilizada a área total do consórcio ou intercalação.

§ 5º No caso de mais de um cultivo no ano, com um ou mais produtos, no mesmo espaço, considera-se efetivamente utilizada a maior área usada no ano considerado.

§ 6º Para os produtos que não tenham índices de rendimentos fixados, adotar-se-á a área utilizada com esses produtos, com resultado do cálculo previsto no inciso I do § 2º deste artigo.

§ 7º Não perderá a qualificação de propriedade produtiva o imóvel que, por razões de força maior, caso fortuito ou de renovação de pastagens tecnicamente conduzida, devidamente comprovados pelo órgão competente, deixar de apresentar, no ano respectivo, os graus de eficiência na exploração, exigidos para a espécie.

§ 8º São garantidos os incentivos fiscais referentes ao Imposto Territorial Rural relacionados com os graus de utilização e de eficiência na exploração, conforme o disposto no art. 49 da Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964.

Cabe ao INCRA fixar, com base nas características regionais e no tipo de atividade predominante em cara área, os índices de rendimento e lotação.

Logo adiante, no artigo 9º, trata dos demais requisitos:

Art. 9º A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo graus e critérios estabelecidos nesta lei, os seguintes requisitos:

I – aproveitamento racional e adequado;

II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

§ 1º Considera-se racional e adequado o aproveitamento que atinja os graus de utilização da terra e de eficiência na exploração especificados nos §§ 1º a 7º do art. 6º desta lei.

§ 2º Considera-se adequada a utilização dos recursos naturais disponíveis quando a exploração se faz respeitando a vocação natural da terra, de modo a manter o potencial produtivo da propriedade.

§ 3º Considera-se preservação do meio ambiente a manutenção das características próprias do meio natural e da qualidade dos recursos ambientais, na medida adequada à manutenção do equilíbrio ecológico da propriedade e da saúde e qualidade de vida das comunidades vizinhas.

§ 4º A observância das disposições que regulam as relações de trabalho implica tanto o respeito às leis trabalhistas e aos contratos coletivos de trabalho, como às disposições que disciplinam os contratos de arrendamento e parceria rurais.

§ 5º A exploração que favorece o bem-estar dos proprietários e trabalhadores rurais é a que objetiva o atendimento das necessidades básicas dos que trabalham a terra, observa as normas de segurança do trabalho e não provoca conflitos e tensões sociais no imóvel.

Os conceitos expostos nos parágrafos 2º a 5º do artigo 9º, acima transcrito, são bastante genéricos e deixam a cargo do Poder Público (quando decide desapropriar o imóvel) e do Poder Judiciário (quando o proprietário resiste à desapropriação) a avaliação do cumprimento, ou não, da função social da propriedade rural.

Em regra, desde que não haja alguma comprovada irregularidade no que se refere aos aspectos econômicos (graus de aproveitamento e eficiência), ambientais, contratuais (parceria ou arrendamento) ou laborais, a propriedade rural cumprirá sua função social e não poderá ser desapropriada para fins de reforma agrária.

Por comprovada irregularidade, deve-se entender alguma condenação ou autuação em processo administrativo ou judicial já transitado em julgado, uma vez que a simples acusação de uma irregularidade não pode e não deve ser capaz de causar efeitos restritivos à propriedade rural.

Classificação segundo o tamanho e possibilidade de desapropriação

Sobre a desapropriação para fins de reforma agrária, vale registrar que, também por força da Constituição Federal (artigo 185), além da propriedade produtiva, ou seja, aquela que cumpre sua função social, as pequenas e médias propriedades rurais não poderão ser desapropriadas.

O que define a pequena e a média propriedade, segundo a Lei 8.629/93 (de novo ela), é o seu tamanho em módulos fiscais:

Art. 4º Para os efeitos desta lei, conceituam-se:

(…)

II – Pequena Propriedade – o imóvel rural:

a) de área até quatro módulos fiscais, respeitada a fração mínima de parcelamento;

III – Média Propriedade – o imóvel rural:

a) de área superior a 4 (quatro) e até 15 (quinze) módulos fiscais;

§ 1º São insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária a pequena e a média propriedade rural, desde que o seu proprietário não possua outra propriedade rural.

§ 2º É obrigatória a manutenção no Sistema Nacional de Cadastro Rural (SNCR) de informações específicas sobre imóveis rurais com área de até um módulo fiscal.

Logo, desde que o proprietário não seja titular de outra área rural, ele não poderá, em nenhuma hipótese, ser desapropriado se seu imóvel rural tiver uma dimensão de até 15 (quinze) módulos fiscais).

E quando mede cada módulo fiscal? Depende do município.

Os parágrafos 2º e 3º do artigo 50 do Estatuto da Terra, com a redação dada pela Lei 6.746/79, trazem as regras para definição:

§ 2º O módulo fiscal de cada Município, expresso em hectares, será determinado levando-se em conta os seguintes fatores:

a) o tipo de exploração predominante no Município:

I – hortifrutigranjeira;

II – cultura permanente;

III – cultura temporária;

IV – pecuária;

V – florestal;

b) a renda obtida no tipo de exploração predominante;

c) outras explorações existentes no Município que, embora não predominantes, sejam expressivas em função da renda ou da área utilizada;

d) o conceito de “propriedade familiar”, definido no item II do artigo 4º desta Lei.

§ 3º O número de módulos fiscais de um imóvel rural será obtido dividindo-se sua área aproveitável total pelo modulo fiscal do Município.

Você pode consultar o tamanho do módulo fiscal de seu município junto ao INCRA ou à EMBRAPA.

Obrigação de georreferenciamento

Se você tem contato frequente com registros de imóveis rurais, certamente já se deparou com alguma descrição parecida com: “começa no riacho A, segue confrontando com Manoel da Silva até encontrar uma árvore mangueira, contornando tal árvore até chegar a uma formação rochosa; depois, virando à direita confronta com os herdeiros do Coronel Joaquim, até novamente chegar ao riacho A, encerrando seu perímetro”.

Parece piada, mas é a triste realidade dos registros imobiliários brasileiros, pelo menos até o advento da Lei 10.267/01. Esta lei trouxe uma série de alterações em outras leis pré-existentes para, em linhas gerais, exigir que a descrição dos imóveis rurais passasse a ser georreferenciada, ou seja, espacialmente posicionada pelo Sistema Geodésico Brasileiro.

A intenção, para além de um cadastro amplo e nacional dos imóveis rurais, permitindo o direcionamento de políticas públicas (como a de desapropriação para reforma agrária) e a redução da evasão fiscal, era combater a famosa “grilagem” e aperfeiçoar o próprio direito de propriedade, garantindo-se a veracidade do registro imobiliário e evitando-se a sobreposição de áreas.

A medida mais importante trazida pela Lei 10.267/01 foi a obrigatoriedade de prévio georreferenciamento para qualquer ato de desmembramento, parcelamento ou remembramento do imóvel rural, assim como qualquer ato de transferência da propriedade.

Delegou-se ao Poder Executivo, ou seja, a um Decreto presidencial, a fixação dos prazos para que a exigência passasse a ser feita.

Sobreveio, então, o Decreto nº 4.449/02, que estabeleceu, originalmente, os seguintes prazos:

Art. 10.  A identificação da área do imóvel rural, prevista nos §§ 3º e 4º do art. 176 da Lei no 6.015, de 1973, será exigida, em qualquer situação de transferência, na forma do art. 9º, somente após transcorridos os seguintes prazos, contados a partir da publicação deste Decreto:

I – noventa dias, para os imóveis com área de cinco mil hectares, ou superior;

II – um ano, para os imóveis com área de mil a menos de cinco mil hectares;

III – dois anos, para os imóveis com área de quinhentos a menos de mil hectares; e

IV – três anos, para os imóveis com área inferior a quinhentos hectares.

§ 1º Quando se tratar da primeira apresentação do memorial descritivo, aplicar-se-ão as disposições contidas no § 4o do art. 9º.

§ 2º Após os prazos assinalados nos incisos I a IV, fica defeso ao oficial do registro de imóveis a prática de quaisquer atos registrais envolvendo as áreas rurais de que tratam aqueles incisos, até que seja feita a identificação do imóvel na forma prevista neste Decreto.

Tais prazos se mostraram inviáveis pela realidade dos cadastros imobiliários brasileiros, motivando, como bem observado por Eduardo Pacheco Ribeiro de Souza, na completa obra “Os Imóveis Rurais na Prática Notarial e Registral – Noções Elementares”, cuja leitura indicamos, a edição de (até então) outros 3 decretos de postergação.

A regra válida hoje é a trazida pelo Decreto nº 9.311/2018, com os seguintes marcos:

I – noventa dias, para os imóveis com área de cinco mil hectares, ou superior;

II – um ano, para os imóveis com área de mil a menos de cinco mil hectares;

III – cinco anos, para os imóveis com área de quinhentos a menos de mil hectares;

IV – dez anos, para os imóveis com área de duzentos e cinquenta a menos de quinhentos hectares;

V – quinze anos, para os imóveis com área de cem a menos de duzentos e cinquenta hectares;

VI – vinte anos, para os imóveis com área de vinte e cinco a menos de cem hectares; e

VII – vinte e dois anos, para os imóveis com área inferior a vinte e cinco hectares.

Esses prazos, por força do § 3º do mesmo artigo 10º da Lei 10.267/01, incluído pelo Decreto nº 5.570/05, contam-se a partir do dia 20/11/2003, de sorte que, na data em que este artigo é escrito (05/2022), somente os imóveis com área abaixo de cem hectares estão livres de realizar o prévio georreferenciamento.

A partir de 20/11/2023, apenas os imóveis com área inferior a vinte e cinco hectares serão dispensados da obrigação; a partir de 20/11/2025, todos os imóveis rurais localizados no território nacional estarão sujeitos ao georreferenciamento. Isso, é claro, se não sobrevier mais um Decreto postergatório.

E como funciona o processo? É relativamente simples.

O proprietário do imóvel rural deverá contratar um topógrafo ou agrimensor para elaborar memorial descritivo (…), executado e assinado por profissional habilitado e com a devida Anotação de Responsabilidade Técnica – ART, contendo as coordenadas dos vértices definidores dos limites dos imóveis rurais, georreferenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro, e com precisão posicional a ser estabelecida em ato normativo, inclusive em manual técnico, expedido pelo INCRA (artigo 9º da Lei nº 10.267/01).

O referencial geodésico (datum) adotado desde 2005 pelo IBGE é o SIRGAS 2000.

Uma vez protocolado no INCRA o memorial descrito georreferenciado, caberá ao órgão analisar se há sobreposição em relação a imóveis vizinhos e, no caso de inexistência, certificar o procedimento, permitindo, assim, que a informação passe a constar da matrícula do imóvel.

Novos georreferenciamentos deverão ser feitos e certificados, naturalmente, sempre que o imóvel passar por desmembramento, parcelamento ou remembramento de áreas.

Propriedade de imóvel rural pelo estrangeiro

Outra importante característica associada ao imóvel rural é a restrição à sua propriedade por estrangeiros.

Trata-se de política constitucional, alinhada a pactos internacionais e justificada, sobretudo, pela soberania nacional sobre o território brasileiro e pela proteção de recursos naturais estratégicos.

Em seu artigo 190, a Constituição Federal relega à lei ordinária a regulação acerca da aquisição de imóveis rurais por pessoas físicas e jurídicas estrangeiras.

Coube à Lei 5.709/71 e seu respectivo Decreto nº 74.965/74, ambos recepcionados pela Constituição, que lhes é posterior, o tratamento do tema.

Já em 2018, o INCRA expediu a Instrução Normativa nº 94, ainda em vigor, para regular mais a fundo a matéria.

Inicialmente, observe-se que apenas o estrangeiro residente no país ou a pessoa jurídica estrangeira autorizada a funcionar no Brasil poderão adquirir imóvel rural.

Logo, estrangeiros sem vínculo com o país, que residam no exterior, não podem ser proprietários de imóveis rurais localizados no Brasil, a não ser por direito de herança.

Os estrangeiros habilitados, ou seja, (i) a pessoa natural estrangeira residente no País, a (ii) pessoa jurídica estrangeira autorizada a funcionar no Brasil e (iii) a pessoa jurídica brasileira equiparada à estrangeira, deverão preencher todos os requisitos constantes na já citada Instrução Normativa nº 94/2018.

Dentre eles, destacamos como mais relevantes:

1) O imóvel deverá ter registro próprio em Cartório e cadastro no SNCR;

2) A pessoa física deverá ser inscrita no Registro Nacional de Estrangeiro (RNE), na condição de permanente, com prazo de validade vigente ou indeterminado;

3) A pessoa jurídica deverá submeter à prévia aprovação do Ministério da Agricultura projeto de exploração agrícola, pecuário, florestal, turístico, industrial ou de colonização, vinculado aos seus objetivos sociais – isso evita ou pelo menos diminui a especulação imobiliária;

4) Se o imóvel estiver localizado em faixa de fronteira ou área considerada indispensável à segurança nacional, deverá ser apresentada anuência prévia da Secretaria Executiva do Conselho de Defesa Nacional; e

5) A escritura pública será obrigatória, ainda que para imóveis com valor inferior a 30 (trinta) salários-mínimos.

A pessoa física estrangeira poderá adquirir livremente, ou seja, sem prévia autorização do INCRA, imóveis rurais de até 3 (três) Módulos de Exploração Indefinida (MEI), mas a autorização será necessária caso a aquisição envolva mais de um imóvel rural, ainda que não seja superado o teto.

O Módulo de Exploração Indefinida, por sua vez, é definido pelo INCRA, por município, e pode ser consultado aqui.

Finalmente, em regra, nenhum estrangeiro poderá ser proprietário de imóveis rurais cuja área supere 50 (cinquenta) MEI´s, em área contínua ou descontínua, senão com autorização do Congresso Nacional.

Os cadastros obrigatórios do imóvel rural

Como se já não fossem suficientes as obrigações relacionadas ao cumprimento da função social da propriedade do imóvel rural, ainda há uma infinidade de cadastros que devem ser realizados e mantidos atualizados pelo proprietário.

Não pretendemos esgotar, aqui, as características de cada um desses cadastros, mas apenas trazer as informações básicas para ajudar o leitor a se manter “em dia” com suas obrigações.

Vamos, então, a cada um deles.

CCIR/SNCR

O primeiro e mais elementar cadastro de qualquer imóvel rural é o feito no âmbito do Sistema Nacional de Cadastro Rural (SNCR), criado pela já mencionada Lei nº 5.868/1972, regulamentada pelo Decreto nº 72.106/1973.

Embora a obrigação de cadastro de imóveis rurais tenha sido prevista no artigo 46 do Estatuto da Terra, o SNCR só foi estruturado, efetivamente, com a publicação da referida Lei nº 5.868/1972.

O SNCR compreende, além do cadastro dos imóveis rurais em si, (i) o cadastro de proprietários e detentores de imóveis rurais, (ii) o cadastro de arrendatários e parceiros rurais, (iii) o cadastro de terras públicas e (iv) o cadastro nacional de florestas públicas.

Parece claro que a intenção do sistema é retratar com grande detalhamento a realidade rural do território brasileiro, monitorando não apenas os imóveis em si, mas todos aqueles que guardam alguma relação com eles, seja essa relação de propriedade ou posse, contratual ou real.

Já em seu artigo 2º, a Lei nº 5.868/1972 obriga todos os titulares de domínio útil ou possuidores a qualquer título de imóveis rurais que sejam ou possam ser destinados à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal ou agroindustrial a prestar a declaração de cadastro, chamada de Declaração de Cadastro Rural (DCR).

O não cumprimento da obrigação de cadastro, segundo o § 1º do mesmo artigo 2º, sujeita o proprietário ou possuidor ao lançamento de ofício de todos os tributos e contribuições devidas pela alíquota máxima, além de multa e demais cominações legais.

Também se insere na gama de obrigações do proprietário rural a atualização do cadastro, sempre que houver qualquer alteração no imóvel rural ou em sua titularidade, ou, ainda que não haja modificação, a cada 5 anos (artigo 6º do Decreto nº 72.106/1973).

Pela sua clareza na definição dos objetivos cadastrais, vale a transcrição do artigo 2º do Decreto nº 72.106/1973:

Art. 2º Os cadastros a que se refere o artigo anterior, integrantes do Sistema Nacional de Cadastro Rural, têm como finalidades primordiais:

I – O levantamento sistemático dos imóveis rurais, para conhecimento das condições vigentes na estrutura fundiária das várias regiões do País, com o objetivo de:

a) fornecer dados e elementos de orientação na programação dos instrumentos de Política Agrícola, a ser promovida e executada pelos órgãos federais, estaduais e municipais atuantes no setor da agricultura;

b) fornecer dados e elementos de informação necessários à formulação e execução dos Planos Nacional e Regional de Reforma Agrária e de Colonização;

c) fornecer os dados e elementos necessários à aplicação dos critérios de lançamentos fiscais atribuídos ao INCRA, e à concessão de isenções demais benefícios previstos na Constituição Federal e na legislação complementar;

II – O levantamento sistemático dos proprietários e detentores de imóveis rurais, para conhecimento das condições de efetiva distribuição e concentração da terra e do regime de domínio e posse vigentes nas várias regiões do País, com vistas a:

a) fornecer dados e elementos necessários ao controle da distribuição das terras e da sua concentração, com relação aos seus proprietários ou detentores a qualquer título;

b) fornecer dados e elementos necessários ao controle das terras tituladas a pessoas físicas ou jurídicas de nacionalidade estrangeira, com vistas à aplicação por parte dos órgãos competentes das normas legais que disciplinam a propriedade, o uso e a posse de terra por estrangeiros;

c) fornecer dados e elementos necessários à classificação dos proprietários, em função do conjunto de seus imóveis rurais;

 d) fornecer dados e elementos necessários à aplicação dos critérios de lançamentos fiscais, referentes a tributos e contribuições para fiscais, atribuídos ao INCRA pela legislação em vigor;

III – O levantamento sistemático dos arrendatários e parceiros rurais, para conhecimento das reais condições de uso temporário da terra, vigentes nas várias regiões do País, visando:

a) fornecer dados e elementos necessários à análise e avaliação dos vários tipos e formas de detenção ou posse da terra, vigentes em cada região do País e sua adequação ao princípio de função social da propriedade, como definido no artigo 2º e parágrafos da Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964;

b) fornecer dados e elementos necessários à emissão de Certificado de Cadastro de Arrendatário ou de Parceiro Rural;

c) fornecer dados e elementos necessários ao controle dos contratos agrários de uso temporário da terra, na forma do disposto no Capítulo V do Decreto nº 59.566, de 14 de novembro de 1966;

IV – O levantamento sistemático das terras públicas federais, estaduais e municipais, visando ao conhecimento das disponibilidades de áreas apropriadas aos programas de Reforma Agrária e Colonização e da situação dos posseiros e ocupantes de terras públicas;

V – A obtenção de dados e elementos necessários às análises micro-econômicas e às amostragens nas várias regiões do País, para fixação dos índices previstos nas alíneas do parágrafo 1º do artigo 46 da Lei nº 4.504 de 30 de novembro de 1964.

VI – A obtenção de dados e elementos, que orientem os órgãos de assistência técnica e creditícia nas tarefas de formulação de seus respectivos planos de assistência ao produtor rural.

O SNCR é mantido pelo INCRA e, uma vez concluído o cadastro do imóvel rural, o documento emitido é o Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR), cuja apresentação, acompanhada da prova de quitação do ITR correspondente aos últimos 5 anos, é obrigatória para desmembrar, arrendar, hipotecar, vender ou prometer em venda imóveis rurais, além de ser condição à homologação de partilha por sucessão causa mortis (artigo 22, §§ 1º a 3º, Lei nº 4.947/1966).

CAFIR/RFB

O segundo cadastro obrigatório, embora relacionado ao primeiro, com ele não se confunde.

Trata-se do CAFIR (Cadastro de Imóveis Rurais), mantido pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil para fins de fiscalização, lançamento e cobrança do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR).

Sobre o tributo, é importante observar que ele tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de imóvel por natureza, localizado fora da zona urbana do município, em 1º de janeiro de cada ano (artigo 1º da Lei nº 9.393/1996).

Logo, tanto o proprietário quanto o possuidor são contribuintes do imposto e, igualmente, responsáveis pelo CAFIR e sua atualização.

Mesmo nas hipóteses de isenção ou imunidade do ITR, o CAFIR continuará sendo obrigatório, a teor do artigo 3º da Instrução Normativa RFB nº 2008/2021, que regula, atualmente, o cadastro.

A inscrição no CAFIR gera o conhecido NIRF (Número do Imóvel na Receita Federal) – substituído pelo CIB (Cadastro Imobiliário Brasileiro) a partir de 2021 – e deve ser feita, assim como eventual atualização, por meio do Documento de Informação e Atualização Cadastral do ITR (DIAC) no prazo de até 60 (sessenta) dias contados da ocorrência de qualquer dos seguintes fatos (artigo 6º da Lei nº 9.393/1996):

I – desmembramento;

II – anexação;

III – transmissão, por alienação da propriedade ou dos direitos a ela inerentes, a qualquer título;

IV – sucessão causa mortis;

V – cessão de direitos;

VI – constituição de reservas ou usufruto.

O descumprimento do referido prazo sujeita o contribuinte ao pagamento de multa de 1% (um por cento) ao mês ou fração sobre o imposto devido, sem prejuízo da multa e juros de mora devidos sobre o ITR em atraso.

Uma vez inscrito o imóvel no CAFIR, o contribuinte deverá prestar anualmente o Documento de Informação e Apuração do ITR (DITR, também chamado de DIAT pela Lei nº 9.393/1996), declarando, na ocasião, o valor da terra nua do imóvel para fins de lançamento do imposto.

Maiores informações sobre o CAFIR podem ser obtidas no site da Receita Federal.

Conclusão

O imóvel rural conta com características bastante peculiares e demanda de seu proprietário um cuidado consideravelmente superior quando comparado ao bem urbano.

Seja no que se refere à sua função social, intimamente relacionada a graus de utilização e eficiência, além de ser moldada por aspectos ambientais e laborais, seja pelos infindáveis cadastros obrigatórios, manter um imóvel rural não é tarefa simples.

Já é hora de olharmos com mais atenção para o imóvel rural para redescobri-lo e reinventá-lo.

Não se pode negar a ele uma função precípua e extremamente relevante no abastecimento das cidades, na produção de commodities, seja para consumo interno, seja para exportação, e, principalmente, na conservação do meio ambiente, mas, por outro lado, tampouco se pode ignorar a realidade do Brasil, país de dimensões continentais que possui um elevado número de imóveis rurais que já não apresentam nenhuma vocação agrária, seja por sua localização muito próximo à sede urbana, seja por características regionais de desenvolvimento.

Parece-nos fazer mais sentido, no atual estágio de desenvolvimento tecnológico (notadamente no que se refere à mecanização e automação da produção rural) e social (com a população predominantemente concentrada na cidade), rever alguns conceitos tradicionais para se permitir, ainda que de forma restrita e controlada, a migração de algumas atividades consideradas urbanas (como moradia e lazer) para o meio rural.

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*Imagem de Getty Images, no Canva Pro.


[1] Resumidamente, quando um recurso é julgado sob o rito de “recurso repetitivo”, a decisão nele proferida será válida para todos os outros processos em curso no país que tratem do mesmo tema, contando, portanto, com um efeito vinculante. Se algum tribunal estadual ou regional, em decisão futura, julgar o mesmo tema de forma distinta à orientação do tribunal superior (que pode ser o STJ, em matéria infraconstitucional, ou o STF, em matéria constitucional), tal julgamento será, inevitavelmente, reformado.

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