Introdução 

O setor de incorporação imobiliária no Brasil, um dos pilares da economia e do desenvolvimento urbano, é dinâmico e sempre repleto de novidades. Mais do que tijolos e concreto, ele é moldado por um complexo ecossistema de alterações legislativas, interpretações jurisprudenciais e debates institucionais que redefinem suas práticas e relações contratuais. 

Dados recentes da ABRAINC (Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias) ilustram esse dinamismo: o setor registrou uma alta de 23,4% nos lançamentos de imóveis nos 12 meses encerrados em janeiro de 2025, comparado ao período anterior. O valor real dos lançamentos também cresceu 13,3% entre fevereiro de 2024 e janeiro de 2025, um reflexo de uma demanda aquecida. Nos segmentos Minha Casa Minha Vida (MCMV) e de Médio e Alto Padrão (MAP), os volumes de vendas e valores reais também apresentaram crescimento expressivo. 

Essa consistência no crescimento demonstra que o setor imobiliário segue forte e resiliente, impulsionando movimentos significativos que exigem atenção redobrada de profissionais e estudiosos da área. Questões que antes eram rígidas, agora ganham flexibilidade, enquanto outras, essenciais para a segurança, são objeto de propostas de fortalecimento e padronização. 

Este artigo é um convite para desvendar as principais inovações que marcaram o cenário recente da incorporação imobiliária. Abordaremos as atualizações trazidas pela Lei nº 14.382/22, que impactaram desde a flexibilização das negociações preliminares (como a reserva de unidade) até a grande redefinição do conceito de incorporação para abraçar as casas isoladas ou geminadas. Exploraremos também as importantes propostas legislativas em tramitação, como a advocacia obrigatória em diversos atos e a exigência de avisos sobre atrasos na obra. 

Prepare-se para um mergulho nas recentes inovações que estão reconfigurando a paisagem da incorporação no país, oferecendo um guia essencial para navegar com segurança e sucesso neste mercado em constante evolução. 

Novidades da Lei nº 14.382/22 e seus desdobramentos 

Negociar antes de Registrar: a reserva de unidade e seus limites  

Imagine planejar um grande concerto: antes de subir ao palco, é preciso testar o som, sentir a reação do público e ajustar o repertório. Algo parecido acontece com a “reserva de unidade” na incorporação imobiliária, mecanismo que vem ganhando relevância prática e jurídica.  

A Lei nº 4.591/64, conhecida como a Lei das Incorporações Imobiliárias, é o coração regulatório das construções que moldam o crescimento urbano do Brasil. Ela organiza o processo pelo qual um terreno pode ser transformado em um conjunto de unidades autônomas — apartamentos, salas comerciais, lojas — oferecendo segurança jurídica a todos os envolvidos: incorporadores, compradores, credores, construtoras e o próprio mercado. 

Um dos pilares dessa legislação é a exigência de registro do memorial de incorporação no Cartório de Registro de Imóveis antes que qualquer “negociação” com terceiros ocorra. Esse memorial funciona como uma planta detalhada do empreendimento, com toda a documentação necessária — projeto arquitetônico, registro da construtora, certidões, cálculo de áreas, e muito mais. Somente após esse registro é que se poderia, até então, “negociar” unidades. 

A Lei nº 14.382/22 promoveu uma alteração sutil no artigo 32 da Lei nº 4.591/64: substituiu a palavra “negociar” pelas expressões “alienar ou onerar”. À primeira vista, trata-se de um mero jogo semântico. Porém, no universo jurídico, onde cada palavra carrega peso normativo, essa substituição representa uma abertura para novas interpretações e práticas. 

Enquanto o termo “negociar” abrange qualquer tratativa, desde a mera intenção de compra até propostas com valor definido, as expressões “alienar” e “onerar” remetem a atos concretos com efeitos patrimoniais: vender, ceder, hipotecar, prometer em garantia, entre outros. 

Ou seja, a nova redação passa a permitir as tratativas preliminares — o que muitos incorporadores e consumidores chamam de “proposta de reserva” — desde que não haja efetiva transferência de propriedade ou criação de ônus sobre a fração ideal do imóvel. 

A proposta de reserva surge como uma figura intermediária entre o desejo de adquirir uma unidade e o compromisso jurídico da compra e venda. É como marcar um lugar na fila antes da bilheteria abrir: você demonstra interesse, o organizador avalia a viabilidade, mas nenhum dos dois está juridicamente vinculado a concretizar o negócio naquele momento. 

Do ponto de vista prático, essa proposta funciona como: 

  • Termômetro de Mercado: Permite ao incorporador sondar o interesse do público em um empreendimento ainda em fase de planejamento, antes de incorrer nos custos significativos do registro da incorporação.  
  • Lista de Interesses: Ajuda a organizar uma lista de potenciais compradores, facilitando o contato posterior para a efetivação das vendas.  
  • Informação Prévia: O futuro adquirente recebe informações preliminares sobre o projeto (localização, tipologia, estimativa de valores), sem assumir qualquer compromisso financeiro ou contratual. 

Contudo, esse mecanismo só é juridicamente aceitável sob uma condição fundamental: não pode haver qualquer pagamento antes do registro da incorporação. O recebimento de valores, mesmo que rotulados como “sinal”, “reserva” ou “taxa administrativa”, poderia ser interpretado como alienação disfarçada — o que traria consequências civis, administrativas e até criminais inclusive a possibilidade de caracterização da contravenção penal prevista no Art. 66, I, da Lei nº 4.591/64, que proíbe “negociar” antes da incorporação regular. 

O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC), ao julgar o Agravo de Instrumento nº 5054611-66.2023.8.24.0000, enfrentou justamente a questão dos limites da “reserva de unidade” antes do registro da incorporação. Nesse caso, a Corte reconheceu que a substituição de termos feita pela Lei nº 14.382/22 no Art. 32 da Lei nº 4.591/64 – que mudou “negociar” para “alienar ou onerar” – teve o efeito de abrandar a rigidez da regra anterior.  

A decisão, proferida em 04 de junho de 2024 pela Quinta Câmara de Direito Civil, com relatoria da Desembargadora Cláudia Lambert de Faria, firmou a tese de que as tratativas negociais, como a publicidade de pré-lançamento e a captação de interessados para reserva de unidades, são permitidas antes do registro da incorporação, desde que não envolvam efetiva alienação ou oneração das unidades 

O acórdão enfatizou a ausência de prejuízo aos consumidores e a não configuração de ilícito por parte da construtora envolvida, pois a conduta se enquadrava como mera divulgação e não como venda disfarçada. Isso estabeleceu um importante precedente para o mercado, sinalizando uma interpretação mais flexível da norma, focada na proteção do consumidor sem engessar as legítimas ações de sondagem de mercado. 

Trata-se, portanto, de um instrumento negocial atípico, mas lícito, desde que estritamente observado o limite entre intenção e execução, devendo o incorporador se atentar para os benefícios e riscos que a nova possibilidade oferece:  

Benefícios  ⚠️ Riscos 
Teste de aceitação do mercado  Interpretação como venda disfarçada 
Termômetro para precificação  Nulidade de instrumentos mal redigidos 
Atrativo para financiamento  Penalidades por má publicidade 

É nesse contexto que a advocacia preventiva se torna indispensável. Incorporadores precisam de orientação jurídica para estruturar propostas de reserva que sejam claras, transparentes, legais e equilibradas, evitando que sejam interpretadas como uma venda antecipada e irregular. 

Essa flexibilização não é inédita em outros ramos jurídicos. No Direito do Consumidor, por exemplo, a figura do “pré-lançamento” é comum no mercado automobilístico ou de eletrônicos, onde os consumidores podem manifestar interesse em adquirir um produto antes mesmo de seu lançamento, desde que não haja cobrança antecipada nem garantias definitivas. 

No mercado financeiro, ofertas públicas de ações (IPOs) também passam por períodos de “road show — apresentações e coleta de intenções de investimento — antes da efetiva disponibilização dos papéis na bolsa. 

Portanto, o que vemos no setor imobiliário é um alinhamento com práticas de mercado que buscam reduzir a assimetria de informação, mensurar a demanda e planejar com base em dados reais, desde que observados os limites legais. 

Destaca-se que a publicidade tem um papel crucial, mas frequentemente negligenciado. Incorporadores que fazem marketing antes do registro do imóvel devem informar clara e destacadamente essa situação, explicando que não é possível firmar contrato de compra e venda nessa etapa. Devem evitar termos como “compre agora” ou “últimas unidades”, usando em vez disso “registre seu interesse” ou “manifeste preferência”. Lembre-se que a publicidade enganosa ou que omite informações infringe o Código de Defesa do Consumidor, podendo gerar multas e anulação de negócios futuros (Art. 37, § 1º, CDC). 

O que o incorporador deve fazer para uma “reserva” segura 

  • Clareza e Transparência: Deixe explícito que o ato é apenas uma manifestação de interesse, não um contrato de compra e venda ou promessa. 
  • Ausência de Pagamento: Sob nenhuma hipótese receba qualquer valor. 
  • Documento Objetivo: Elabore um “Termo de Reserva” ou “Proposta de Reserva” simples e claro, que não crie obrigações financeiras ou de transferência de propriedade. 
  • Informação Legal: Inclua no documento a informação de que a efetivação do negócio está condicionada ao registro do memorial de incorporação. 
  • Publicidade Responsável: Adeque todo o material de marketing para refletir a fase do empreendimento, evitando termos que induzam o consumidor a erro sobre a disponibilidade imediata ou a possibilidade de compra antes do registro. 

A mudança legislativa promove maior fluidez na relação incorporador-mercado, mas cobra um preço: transparência e rigor técnico na elaboração das propostas de reserva. A ausência de clareza ou o uso desse instrumento de forma abusiva pode contaminar a credibilidade do empreendimento e gerar passivos judiciais vultosos. 

Por isso, é fundamental:

A substituição da palavra “negociar” por “alienar ou onerar” representa mais do que uma alteração semântica: é uma reconfiguração das etapas negociais do mercado imobiliário. Ao permitir a manifestação de interesse antes do registro da incorporação, a nova redação da lei cria um espaço legítimo de sondagem de mercado, desde que os limites da legalidade sejam rigidamente respeitados. 

Em um setor marcado por altos investimentos e riscos consideráveis, essa pequena abertura pode representar a diferença entre o sucesso e o fracasso de um projeto — ou entre a segurança e a judicialização de uma transação. 

A proposta de reserva, se bem utilizada, pode ser o novo “termômetro” do mercado imobiliário brasileiro. Mas se mal interpretada, pode se tornar uma armadilha jurídica. Enquanto os tribunais superiores não firmam um entendimento definitivo, a orientação é caminhar com atenção redobrada e apoio jurídico especializado. Afinal, no universo das incorporações, antecipar-se demais pode custar caro. 

Reflexos da Incorporação de Casas 

A Lei nº 14.382/2022, promulgada em 2022, não se limitou a flexibilizar a fase de negociação preliminar no mercado imobiliário; ela operou uma redefinição fundamental na própria Lei de Incorporações (Lei nº 4.591/64). Trata-se, portanto, de relevante alteração no mundo das incorporações. Anteriormente, o conceito de incorporação estava fortemente associado à constituição de condomínios edilícios, tipicamente apartamentos. 

Assim, a legislação ampliou esse horizonte, incluindo a possibilidade de incorporação que envolve a venda de lotes vinculada à construção de casas isoladas ou geminadas, mesmo que não haja a formação de um condomínio tradicional.  

Pense nisso como um novo conjunto de peças no nosso jogo de construção: é possível aplicar o mesmo rigor, a mesma transparência e a mesma segurança jurídica de um grande empreendimento a projetos de casas individuais. A casa é vendida “na planta” sobre um lote específico, com um projeto e um cronograma definidos, mesmo que não faça parte de um condomínio formal. Esse assunto já foi detalhadamente tratado nesse artigo do blog.  

Essa mudança foi um marco para o mercado de casas e loteamentos. Ela trouxe para a luz da regulamentação operações que, antes, viviam em uma “zona cinzenta”, muitas vezes limitadas a contratos de empreitada ou vendas de lotes sem a garantia de uma construção formalizada. O legislador buscou clarear: a incorporação de casas diz respeito à venda de um imóvel futuro – a casa já projetada – em um lote, e não apenas a venda do terreno. 

Para entender melhor essa diferença crucial, imagine a seguinte situação: um loteamento tradicional vende o “terreno nu”, com a promessa de urbanização e infraestrutura. Já a incorporação de casas vende a “casa com o terreno”, um pacote completo com o projeto da casa e prazos de entrega já definidos. 

Podemos ilustrar as principais diferenças desses institutos no quadro comparativo a seguir: 

Ao abraçar essas novas modalidades, a lei estendeu a elas os benefícios intrínsecos do regime de incorporação, gerando reflexos práticos e jurídicos que têm se consolidado ativamente nos últimos meses: 

1. Reforço da Segurança Jurídica e Transparência para o Comprador: 

A principal consequência é a solidez na compra de uma casa “na planta”. A obrigatoriedade do registro da incorporação significa que o comprador tem acesso prévio a um “manual completo” do seu futuro imóvel – o memorial de incorporação –, protegendo-o contra riscos e surpresas. Isso traz tranquilidade e clareza, desde o projeto arquitetônico até os detalhes da obra. 

2. Regulamentação Efetiva e Adaptação dos Cartórios: 

Os órgãos de registro imobiliário, como as Corregedorias Estaduais de Justiça, têm trabalhado intensamente para emitir orientações e normas. Isso mostra que a lei está sendo internalizada e aplicada de forma prática pelos cartórios, uniformizando os procedimentos e facilitando o registro dessas novas incorporações. 

3. Um Impulso para Pequenos Construtores e Empreendedores: 

A nova legislação democratizou o acesso ao regime de incorporação, tornando-o mais viável para empreendimentos de menor porte. A dispensa da minuta da convenção de condomínio (quando não há formação de um condomínio formal) reduz a burocracia, incentivando mais construtores a atuar com a segurança e a credibilidade que só a incorporação oferece. É uma ponte que conecta pequenos projetos às grandes garantias. 

4. Casos Pioneiros e Jurisprudência em Construção: 

Embora a jurisprudência de tribunais superiores sobre esse ponto ainda esteja em formação, a lei já gerou casos práticos notáveis que servem de exemplo. Um marco importante foi o primeiro registro de uma incorporação de casa única no Brasil, realizado em Cotia/SP, em fevereiro de 2024. Isso mostra que a teoria virou prática, abrindo caminho para outros empreendimentos seguirem o mesmo modelo. Essas experiências reais e os debates jurídicos em andamento continuam a moldar a interpretação da lei. 

5. Acesso a Mecanismos Vitais de Proteção ao Investimento: 

Com o enquadramento na incorporação, esses projetos ganham acesso a ferramentas de segurança cruciais. O Patrimônio de Afetação, por exemplo, separa os bens do empreendimento do patrimônio do incorporador, blindando o investimento do comprador contra eventuais problemas financeiros da construtora. É como colocar o dinheiro do projeto em uma ‘caixa-forte’ separada e exclusiva.  

Além disso, há a possibilidade de acesso ao Regime Especial de Tributação (RET), que oferece vantagens fiscais significativas, tornando os empreendimentos mais competitivos e, potencialmente, reduzindo custos para o consumidor final. 

Com esses dois mecanismos, o incorporador reduz a carga tributária, e suas receitas estarão sujeitas a uma alíquota unificada de 4%, compreendendo os impostos e contribuições federais IRPJ, CSLL, PIS e COFINS. 

A Lei nº 14.382/2022 não é apenas uma novidade; ela é um catalisador de mudanças contínuas no setor imobiliário. Seus impactos se estendem, e sua aplicação continua a ser um tema central de debate e aprimoramento por profissionais e órgãos reguladores. Essa adaptação legislativa reflete a evolução do mercado brasileiro e a busca incessante por um ambiente de negócios cada vez mais seguro, transparente e dinâmico. 

Comissão de representantes: Formação e Importância 

A comissão de representantes dos adquirentes sempre foi um órgão crucial para a fiscalização e a proteção dos interesses dos compradores em um empreendimento imobiliário. Contudo, a Lei de Incorporações (Lei nº 4.591/64) já previa essa figura, mas, na prática, sua formação nem sempre ocorria, deixando uma verdadeira lacuna na representatividade dos adquirentes. 

É nesse ponto que a Lei nº 14.382/2022 desempenhou um papel fundamental, vindo para reforçar essa iniciativa já existente e, mais do que isso, tornar sua formação expressamente obrigatória e com um prazo definido 

Pela nova regra, fica instituída a obrigação de a comissão ser organizada em seis meses a partir da data do registro do memorial da incorporação. Antes da nova lei, muitos empreendimentos eram concluídos sem essa comissão, que tem o papel vital de acompanhar e fiscalizar o uso dos recursos por parte do incorporador. 

Essa comissão, um grupo de adquirentes eleito em assembleia geral ou designado no contrato de construção, deve ser composta por, no mínimo, três membros. Sua formação compulsória visa garantir que, desde as fases iniciais do projeto, os interesses dos futuros proprietários sejam representados de forma organizada e legal. A comissão atua como um canal de comunicação direto com o incorporador, acompanhando o andamento da obra, a aplicação dos recursos e, em casos extremos, assumindo a gestão do empreendimento em situações de paralisação ou falha do incorporador. 

A obrigatoriedade e o prazo estipulado pela Lei nº 14.382/2022 representam um avanço significativo na governança e na proteção do consumidor no setor, transformando uma possibilidade em uma exigência concreta. Isso fortalece a voz dos adquirentes e contribui para um ambiente de incorporação mais transparente e seguro para todos. 

Propostas Legislativas em Destaque 

Advocacia Obrigatória: Proposta da OAB reforça os alicerces jurídicos 

Erguer um prédio exige engenheiros e arquitetos. Estruturar um empreendimento imobiliário exige, da mesma forma, uma fundação jurídica sólida.  

Pensando nisso, a o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) propôs alterações à Lei de Incorporações para tornar obrigatória a participação de advogados em dois momentos cruciais: a elaboração do memorial de incorporação e a destituição do incorporador. A iniciativa da OAB visa aumentar a segurança jurídica e a profissionalização do setor. 

A proposta pretende incluir no Artigo 32 da Lei nº 4.591/64 a exigência de que o requerimento para o registro do empreendimento seja subscrito por advogado. 

Imagine o memorial de incorporação como a certidão de nascimento de um edifício. Ele contém uma série de documentos complexos, que vão desde projetos arquitetônicos e certidões negativas até cálculos de áreas e informações financeiras. Erros ou omissões nessa fase podem atrasar o empreendimento, gerar custos adicionais e, o que é pior, levar a litígios futuros. 

Além disso, a proposta da OAB altera o Artigo 43 da Lei nº 4.591/64. Esse artigo trata da destituição do incorporador em caso de paralisação ou atraso injustificado da obra, ou descumprimento de outras obrigações contratuais. Nesses casos, a comissão de representantes dos adquirentes assume a obra para dar-lhe continuidade. Já tratamos em artigo anterior sobre a importância da função da comissão de representantes dos adquirentes, clique aqui e saiba mais.  

A proposta estabelece que a comissão de representantes dos adquirentes, ou qualquer adquirente individualmente, deverá formalizar o pedido para averbar a destituição no registro de imóveis, exigindo representação legal no procedimento de destituição do incorporador. 

A destituição do incorporador é uma etapa sensível e, muitas vezes, litigiosa. Envolve direitos e deveres complexos, valores significativos e a continuidade de um empreendimento que afeta centenas de famílias. 

A presença de um advogado, nesse contexto, funciona como um mediador técnico, garantindo que o processo respeite os princípios do contraditório e da ampla defesa, previna desgastes e judicializações desnecessárias, além de assegurar que todos os procedimentos legais e registrais serão seguidos à risca. Sem um advogado, o processo pode se tornar um campo minado para os adquirentes. 

Vale lembrar que outros procedimentos extrajudiciais — realizados fora do ambiente judicial, diretamente em cartórios ou órgãos administrativos — já exigem a presença de um advogado. 

Advocacia Obrigatória em Procedimentos Extrajudiciais Atuais:

Portanto, a proposta da OAB não cria uma nova regra, mas apenas alinha a incorporação imobiliária com padrões já consolidados em outras áreas do direito, onde a expertise jurídica prévia demonstrou ser um fator de segurança e eficiência. 

A obrigatoriedade da advocacia na incorporação imobiliária deve ser vista como um investimento em solidez e previsibilidade, e não como uma burocracia extra. 

Em um mercado onde falhas processuais podem resultar em demoras, litígios ou perda de confiança dos adquirentes e investidores, a presença de um profissional do direito desde as fases iniciais e nos momentos críticos oferece uma série de vantagens, tais como: 

A proposta da OAB busca fortalecer os alicerces jurídicos do mercado imobiliário, tornando-o mais previsível e seguro para todos os envolvidos. Embora ainda em tramitação, a medida reforça a ideia de que a advocacia preventiva é um diferencial competitivo, capaz de transformar potenciais problemas em processos fluidos e eficazes. 

Para incorporadores e construtoras, a adaptação a essa eventual nova regra exigirá uma revisão dos fluxos internos e um investimento em assessoria jurídica especializada. Para o mercado como um todo, é uma aposta na maturidade e na proteção dos direitos dos envolvidos em um dos setores mais dinâmicos da economia brasileira. 

 

Exigência de representação por advogado em outros atos 

No bojo das discussões sobre a segurança jurídica na incorporação imobiliária, os projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional não se limitam à proposta de participação de advogados na elaboração do memorial de incorporação e na destituição do incorporador. Há também um movimento crescente que busca garantir a representação por advogado em outros atos essenciais relacionados à incorporação, como a elaboração e registro da convenção de condomínio. 

O Projeto de Lei (PL) 1513/21 propõe tornar obrigatório o visto de advogado no registro dos atos constitutivos dos condomínios. A proposta busca incluir essa exigência no Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), definindo-a como atividade privativa da advocacia. 

A justificativa principal para essa medida é garantir maior segurança jurídica aos condôminos. Argumenta-se que a atuação de um advogado na elaboração da convenção e do regimento interno do condomínio contribui para prevenir injustiças, evitar restrições desmedidas de direitos e solucionar problemas decorrentes de documentos elaborados sem a devida atenção. 

O parecer da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados examinou o PL 1513/21 e opinou pela sua constitucionalidade, juridicidade e adequação técnica. O parecer recomendou a aprovação da proposta na forma de um substitutivo. 

O substitutivo ao PL 1513/21 propõe alterações na Lei nº 8.906/94 (Estatuto da OAB) e na Lei nº 4.591/64 (Lei de Incorporações Imobiliárias). As mudanças visam incluir a obrigatoriedade do visto de advogado no registro dos atos constitutivos de condomínio edilício e em outras etapas do processo de incorporação imobiliária. Especificamente, o substitutivo determina que a convenção e o regimento interno do condomínio só poderão ser registrados se tiverem a assinatura de um advogado. Além disso, estabelece a necessidade de representação por advogado para o incorporador na descrição e caracterização do empreendimento junto ao Registro de Imóveis, e para a comissão de representantes ou adquirentes na averbação da destituição do incorporador. 

O PL 1513/21 encontra-se em tramitação conclusiva na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados. 

Avisos de atraso na obra  

A crescente demanda por transparência na comunicação tem se destacado no mercado imobiliário, especialmente no que diz respeito ao acompanhamento do andamento das obras. Reconhecendo a importância de manter os compradores bem-informados, alguns projetos de lei em discussão propõem que a incorporadora imobiliária tenha a obrigação de comunicar ao comprador sobre possíveis atrasos na obra. 

Essa medida busca fortalecer a relação entre consumidor e empresa, além de evitar desgastes desnecessários. A ideia é que, em vez de uma comunicação reativa ou focada apenas em problemas já existentes, as incorporadoras adotem uma postura proativa e preventiva. Isso significa alertar os compradores sobre qualquer alteração no cronograma que possa afetar o prazo de entrega, oferecendo mais clareza e previsibilidade. 

Essa iniciativa está alinhada com o princípio da boa-fé objetiva e proporciona maior segurança aos compradores, permitindo que eles se organizem diante de eventuais mudanças no planejamento.  

Nesse contexto, o Projeto de Lei (PL) 1.950/2020 surge com o objetivo de ampliar a transparência e a segurança para quem adquire imóveis na planta. Ele propõe que as incorporadoras sejam obrigadas a fornecer informações mensais sobre o andamento das obras, reconhecendo a importância de uma comunicação antecipada e clara, principalmente em relação a possíveis atrasos.  

O objetivo é mitigar a assimetria de informações entre incorporadora e comprador, permitindo que o adquirente acompanhe o progresso da obra e possa se planejar adequadamente. Nesse sentido, o projeto original previa que as incorporadoras deveriam avisar o comprador com seis meses de antecedência sobre possíveis atrasos na entrega do imóvel, bem como fornecer informações mensais sobre o andamento da obra em caso de atraso na entrega. 

A Comissão de Indústria, Comércio e Serviços (CICS) da Câmara dos Deputados aprovou um substitutivo ao PL 1.950/2020, que altera a Lei nº 4.591/64, para incluir a obrigatoriedade de aviso prévio de seis meses em caso de atraso na entrega do imóvel. Além disso, caso o atraso supere os 180 dias, os compradores dos imóveis deverão receber informações mensais sobre o andamento das obras.  

O projeto será analisado agora, em caráter conclusivo, nas comissões de Defesa do Consumidor, e de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ). Para virar lei, a proposta precisa ser aprovada pela Câmara e pelo Senado. 

Conclusão 

Conforme explorado, os últimos meses trouxeram importantes avanços e propostas no cenário jurídico da incorporação imobiliária. Testemunhamos desde a flexibilização das negociações preliminares de unidades, chancelada pela Lei nº 14.382/22 e por decisões judiciais, que permite um ‘termômetro de mercado’ mais ágil (sem pagamentos antecipados), até a redefinição da própria incorporação para abarcar casas isoladas ou geminadas, ampliando a segurança jurídica para diversos tipos de empreendimentos. 

Paralelamente, a pauta legislativa avançou com propostas significativas, como a advocacia obrigatória em momentos cruciais do processo e a transparência nos avisos de atraso na obra, refletindo uma busca por maior profissionalização e proteção do consumidor. 

A incorporação imobiliária, como todo grande projeto, exige mais do que planejamento técnico; demanda uma fundação jurídica inabalável e uma constante adaptação. As múltiplas mudanças e discussões abordadas neste material alteram o tabuleiro do mercado, exigindo atenção contínua e uma estratégia legal proativa dos profissionais envolvidos. 

Neste cenário dinâmico, antecipar-se às novas exigências, compreender as nuances legais e investir em assessoria jurídica especializada deixam de ser um diferencial para se tornarem um imperativo para o sucesso. Somente assim será possível tomar decisões mais informadas, mitigar riscos e construir empreendimentos que não sejam apenas sólidos em sua estrutura física, mas também sustentáveis e seguros ao longo do tempo. 

Nossa equipe, formada por profissionais especialistas na área, está pronta para atendê-lo! Será um prazer ajudar a navegar por essas mudanças. 

Esperamos que este artigo tenha fornecido um guia valioso sobre as novidades recentes da Incorporação Imobiliária, auxiliando você a compreender melhor os aspectos legais e práticos desse negócio jurídico essencial. 

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