Como já trouxemos anteriormente, a Lei da Liberdade Econômica, promulgada em 2019, veio para assegurar autonomia ao particular para empreender.

No mundo dos negócios, é muito comum que alterações na composição da empresa sejam feitas, tanto para viabilizar negociações quanto para garantir uma melhor rentabilidade à organização.

Você provavelmente já se deparou com alguma modificação empresarial, sem que, contudo, soubesse como se dá esse processo.

Certas alterações, são, inclusive, amplamente divulgadas e conhecidas pelo público, como no caso da incorporação da Sadia pela Perdigão, em 2011, que originou a Brasil Foods (BRF).

Recentemente foi noticiada a cisão empresarial do Itaú Unibanco e da XP Investimentos, incorporada pela XPart, uma holding criada pelo Itaú Unibanco e XP Inc.

Verifica-se, portanto, que são movimentações comuns no meio empresarial as reorganizações societárias, que podem influenciar diretamente na vida do consumidor. Essas alterações podem ser: transformação, incorporação, fusão ou cisão (parcial ou total).

A depender do objetivo da sociedade, opta-se por uma ou mais operações distintas.

Hoje, trataremos especificamente da cisão empresarial, abordando seu conceito, modalidades e procedimento, o que viabilizará, também, a compreensão das demais formas de alteração da composição de uma empresa.

Reorganização Societária

Em oportunidade anterior, tratamos dos tipos societários e suas distinções no nosso artigo sobre o Procedimento para abertura de Empresas.

Uma vez aberta a sua empresa, você poderá precisar que alterações em sua organização sejam feitas. Essas alterações se dão por meio da chamada Reorganização Societária, que consiste em quatro operações distintas.

As operações societárias são procedimentos adotados no âmbito de uma empresa de forma a alterar sua estrutura, seja modificando o seu tipo societário ou alterando o tamanho e complexidade de sua composição.

Apesar de tais operações se aplicarem a qualquer tipo societário, elas estão descritas na Lei de Sociedades Anônimas (S.A.), o que não impede sua observância nas Sociedades Limitadas (LTDA).

Há, ainda, a Instrução Normativa n° 35/2017 que regula os procedimentos para cada uma das operações societárias.

As operações societárias estão previstas nos artigos 220 e seguintes da Lei das S.A. e são: transformação, incorporação, fusão e cisão empresarial.

Essas operações poderão ocorrer entre sociedades de tipos iguais ou diferentes. Vejamos a seguir cada uma delas.

Transformação

A transformação societária consiste, em síntese, na mudança de um tipo societário para outro.

Ela acontece, por exemplo, quando uma Sociedade Limitada deseja se transformar em Sociedade Anônima, ou vice-versa, não havendo, necessariamente, alteração no capital social da empresa ou no regime tributário.

Para que ela seja adotada é necessária a aprovação unânime dos sócios, exceto nos casos em que o contrato ou estatuto social preveja tal possibilidade, sendo facultado ao sócio que não concorde com a alteração deixar a sociedade.

Fusão

Já na fusão societária, há a junção de duas ou mais sociedades para a formação de uma nova. Nesse caso, as sociedades que desejam se unir são extintas, dando início a uma nova pessoa jurídica.

A nova sociedade se torna responsável por todas as obrigações e direitos existentes previamente à operação.

Incorporação

Diferentemente da fusão, em que há a união de outras sociedades para a formação de uma nova empresa, na incorporação uma sociedade absorve a outra.

Assim, a incorporadora mantém sua identidade empresarial, apenas ampliando o seu capital social com o da empresa que será absorvida, enquanto a empresa incorporada é extinta.

Cisão

Por fim, a cisão empresarial é a última modalidade de operação societária prevista na Lei das S.A.

Trata-se do processo de divisão do capital social de uma empresa, em que há transferência de seu capital para uma ou mais sociedades.

A cisão pode se dar de várias formas distintas, as quais trataremos em seguida.

O que é a cisão empresarial?

Pelo próprio nome da operação já é possível inferir do que se trata esse procedimento. Na cisão empresarial, o capital social – em parte ou em sua integralidade – é separado, dando origem a novas sociedades ou passando a integrar o capital de empresas já existentes.

O conceito de cisão está previsto no artigo 229 da Lei das S.A:

Art. 229. A cisão é a operação pela qual a companhia transfere parcelas do seu patrimônio para uma ou mais sociedades, constituídas para esse fim ou já existentes, extinguindo-se a companhia cindida, se houver versão de todo o seu patrimônio, ou dividindo-se o seu capital, se parcial a versão.

Desse modo, existem vários cenários nos quais uma cisão poderá se dar: com a divisão da totalidade do capital social ou de apenas uma parte dele, o que classificará a cisão em total ou parcial.

Cisão parcial

Na cisão parcial, apenas uma parte do capital social da empresa cindida é separado.

A parcela do capital cindido poderá dar origem a uma nova sociedade ou integrar uma ou mais empresas já existentes.

Aqui, a empresa cindida continuará existindo, mas agora, com um capital social menor.

A é a empresa cindida.

B é parte do capital social de A que foi separado. Essa fração do capital social poderá:

  • Originar nova(s) sociedade(s);
  • Integrar o capital social de uma sociedade já existente. Nessa hipótese, serão aplicadas as regras da incorporação societária;
  • Ser utilizada em parte para originar uma nova empresa e outra parte para ser incorporada à sociedade já existente.

Em caso de cisão parcial com a criação de nova empresa, a assembleia geral deverá deliberar sobre a divisão, desde que essa se dê de forma justificada. Discutiremos sobre as principais razões para a cisão empresarial a seguir.

Tanto a empresa cindida quanto a nova deverão realizar o arquivamento e publicações dos atos de alteração contratual/estatutária das empresas no órgão competente.

A empresa que incorporar a parcela cindida da sociedade é sucessora de todos os direitos e obrigações que lhe cabiam à época, devendo assegurar, inclusive, o direito dos credores.

Cisão total

Como o próprio nome indica, na cisão total há divisão integral do capital social da empresa cindida, o que gera a sua extinção.

Porém, seu capital social será utilizado para a formação de novas empresas ou para incorporação de outras já existentes.

Com a cisão total e extinção da empresa cindida, deverão os administradores das novas sociedades ou das incorporadoras realizarem o arquivamento dos atos de alteração e constitutivos das empresas.

Quanto à responsabilidade, cada empresa que incorporar o capital social da sociedade extinta, responderá na proporção dos patrimônios adquiridos.

Assim, pela cisão total de uma empresa, o seu capital social poderá:

  • Originar novas sociedades;
  • Incorporar empresas distintas;
  • Ser utilizada em parte para originar uma nova empresa e outra parte para ser incorporada à sociedade já existente.

Quando devo optar pela cisão empresarial?

Trazemos aqui algumas das razões pelas quais as empresas podem optar pela cisão empresarial:

Conflito de interesses

Para que uma empresa seja considerada uma sociedade é necessário, dentre outros requisitos, que haja a pluralidade de sócios/acionistas, com interesses em comum de exercer determinada atividade empresarial.

Porém, nem sempre os interesses dos integrantes permanecerão correspondentes, podendo gerar conflitos no âmbito da empresa.

Diante da divergência de interesses ou existência de conflitos, rompido o affectio societatis, poderá ocorrer uma cisão empresarial, de modo que aquele sócio que não mais deseja integrar a sociedade se separe dos demais, retirando a parte do capital social que lhe compete.

Assim, a cisão empresarial poderá ser a solução no caso de conflitos entre os sócios ou de seus interesses.

Ressalta-se que diante de um conflito em que não seja possível a sua resolução, a cisão empresarial poderá ser pleiteada por via judicial.

Morte de um dos sócios

Outra razão para se adotar a cisão societária é pela morte de um dos sócios.

Nesta situação, os demais sócios podem não ter interesse em continuar na sociedade com os herdeiros, ou os próprios sucessores do de cujus podem não querer integrar a sociedade.

Em qualquer um dos casos, haverá a cisão empresarial.

Estratégia de crescimento

A cisão empresarial pode também ser adotada como medida estratégica para garantir o crescimento da empresa. Por exemplo, quando uma empresa possui mais de uma atividade específica e deseja ampliá-la, dividir o capital social entre duas novas empresas com objetos distintos poderá fortalecer a atividade, criando um grupo empresarial ainda mais forte.

Nesse caso, a cisão empresarial será uma decisão estratégica dos sócios.

Ultrapassar crises

Diante de crises econômicas e sociais, a cisão empresarial pode ser uma boa alternativa, pois diminuindo o tamanho de uma empresa, os custos tendem também a cair. Além disso, as oportunidades para empresas de menor porte são igualmente melhores.

Quais são as vantagens da cisão empresarial?

Como dito no tópico anterior, a cisão empresarial pode ser utilizada para harmonizar a relação entre os sócios, quando há algum conflito de interesses ou para viabilizar o crescimento da empresa e driblar momentos de crises.

Desse modo, podemos mencionar como vantagens da cisão:

  • Aumento de competitividade no mercado;
  • Ampliação da atuação no mercado;
  • Diversificação das atividades de atuação;
  • Redução de custos e riscos;
  • Redução da carga tributária;
  • Administração de conflitos e adequação dos interesses dos sócios;
  • Mudança de gerenciamento e objetivos da empresa.

Uma desvantagem considerável que pode ser mencionada no procedimento de cisão, contudo, é que a empresa que passa por cisão – seja parcial ou total –, não poderá optar pelo Simples Nacional após o desmembramento, devendo aguardar o prazo de cinco anos após o registro da cisão para poder optar novamente pelo regime.

Como fazer uma cisão empresarial?

A cisão empresarial, parcial ou total, assim como as demais operações societárias (incorporação e fusão), precisa obedecer a um procedimento, que envolve a coleta de informações, juntadas de documentos e realização de avaliações periciais, que irão instruir esse processo.

Vejamos, passo a passo, o procedimento da cisão empresarial:

Avaliação da empresa

A avaliação ou “Valuation” da empresa cindida e da incorporadora é fundamental para garantir a viabilidade do procedimento, bem como para atribuir legitimidade ao processo frente aos credores.

Por meio desse procedimento, verifica-se o valor real da empresa no mercado, analisando sua situação financeira e estimando sua rentabilidade.

Feita a avaliação das empresas, seus sócios poderão vislumbrar uma operação societária mais adequada, justificando-a para os demais.

O laudo de avaliação da empresa cindida deverá ser aprovado pela empresa receptora, quando houver cisão parcial ou total para sociedades já existentes.

Apresentação de justificativa em Assembleia Geral

Realizada a avaliação empresarial, é necessária a apresentação de uma justificativa em Assembleia Geral.

Nessa assembleia, deverão ser apresentados documentos que comprovem a viabilidade da operação, tais como, o balanço patrimonial da empresa, com a devida avaliação do patrimônio líquido, bem como a quantidade de ações/cotas que serão cindidas.

Esse procedimento se dá tanto na empresa que será cindida quanto na receptora de capital social.

Apresentam-se, nesse momento, os documentos aptos a comprovar o valor da empresa cindida e, se for o caso, também da incorporadora, tais como:

  • Balanço Patrimonial;
  • Laudo de Avaliação do Patrimônio Líquido;
  • Cópias do Contrato Social e alterações;
  • Declaração de Informações Econômico-Fiscais da Pessoa Jurídica (DIPJ);
  • Declaração do Imposto de Renda Retido na Fonte (DIRF);
  • Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF); 
  • Demonstrativo de Apuração de Contribuições Sociais (DACON).

Outro documento de extrema relevância nesse processo é o protocolo de intenções, que demonstra os objetivos empresariais com a adoção da cisão societária.

Por se tratar de uma documentação muito extensa, é ideal que você disponha de um profissional especializado para fazer esse levantamento, de forma a garantir que o processo de cisão não gere qualquer risco ao seu negócio.

A instrução e acompanhamento do procedimento por advogado devidamente habilitado é fundamental para a segurança da operação.

Ainda, para aprovação da cisão, em se tratando de Sociedades Anônimas, é exigido o quórum qualificado, ou seja, é necessária a concordância de acionistas que representem mais da metade das ações com direito a voto, se o Estatuto não estipular um quórum maior.

Já nas sociedades limitadas, o quórum de aprovação para alteração do capital social é de ¾, ou seja, sócios que detenham, conjuntamente, 75% do capital social da empresa.

Se da cisão houver aumento de capital, é necessária a expedição de uma nova DBE, contendo o código da cisão parcial ou da extinção por cisão total.

Elaboração do ato de alteração/constituição social

Apresentada a documentação necessária e aprovada a cisão da empresa pela assembleia geral, deve ser redigido o ato de alteração do contrato ou estatuto social ou, ainda, em caso de a cisão originar nova(s) empresa(s), é preciso que se elabore seus respectivos atos constitutivos.

Esse documento deverá conter, dentre outras informações:

  • a parcela do capital que será cindida;
  • a destinação desse capital, se será ou não incorporado a outras empresas;

Em caso de incorporação da parcela cindida por outra empresa, a incorporadora também deverá celebrar uma alteração contratual/estatutária.

A redação das alterações contratuais e dos atos constitutivos originados da cisão deverá ser acompanhada de profissional especializado. Para isso, conte com nossa equipe, que se encontra à disposição para atender a você e seu negócio da melhor forma possível.

Procedimento na Junta Comercial

O procedimento de alteração é bem similar ao do ato constitutivo de empresa, conforme já abordado no artigo de Procedimento para abertura de Empresas.

Assim como para se iniciar uma empresa, qualquer alteração do seu capital social também exigirá a Consulta Prévia de Viabilidade e a Solicitação do Documento Básico de Entrada.

Em seguida, é necessário o preenchimento do módulo integrador, que gerará um número a ser informado no registro digital.

Pactuada a elaboração da alteração, essa deverá ser levada a registro na Junta Comercial do seu estado ou no Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas, o mesmo órgão responsável pelo arquivamento do ato constitutivo da empresa.

Para tanto, paga-se a taxa de registro da cisão, que na Junta Comercial de Minas Gerais, até o ano de 2021 é de R$ 444,71 (quatrocentos e quarenta e quatro reais e setenta e um centavos).

Além da alteração e do ato constitutivo, se da cisão se originar nova sociedade, é necessário o arquivamento do protocolo de intenções, a justificativa e o laudo de avaliação que embasaram o processo.

Esse ato é fundamental para assegurar o procedimento, dando a ele ampla publicidade e legitimidade.

Anulação da cisão

Se do processo de cisão houver algum dano aos credores da empresa cindida, a esses é facultado pleitear judicialmente a anulação do ato em até 90 dias da cisão, desde que haja efetivo prejuízo ao seu direito de crédito (não recepção integral pela incorporadora ou alteração da natureza do crédito).

Para se evitar qualquer processo de anulação da cisão, o que acarretaria prejuízo financeiro para ambas as empresas, dado os gastos provenientes do processo, é ideal que os credores das empresas que serão afetadas com o procedimento sejam previamente notificados por via extrajudicial. Assim, qualquer controvérsia poderá ser solucionada antes da concretização do negócio, o que é benéfico para todas as partes envolvidas. 

Desse modo, tenha um advogado especializado para lhe orientar.

Regime de tributação adotado

No que diz respeito ao Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o lucro relativo ao ano-calendário, poderão ser calculados com base no lucro real. No entanto, atendendo às condições necessárias, poderão ser calculados com base no lucro presumido.

Atuação do CADE

Quando o procedimento de reorganização societária ocorrer entre empresas de grande porte e que detêm participação significativa no mercado, a realização das operações de fusão, incorporação e cisão fica condicionada à aprovação do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), de forma a coibir riscos à livre concorrência, ou a configuração de monopólios ou oligopólios.

Conclusão

A partir da exposição feita ao longo desse texto, é possível verificar que as reorganizações societárias são procedimentos de extrema relevância e fundamentais para a regularidade das atividades empresariais, adequando a sua atividade ao mercado.

Isso porque elas possibilitam a continuidade da atividade empresarial, seu desdobramento e alteração, mesmo quando um ou alguns dos sócios de uma empresa não possuem mais interesse em continuar com a sociedade.

Porém, esse procedimento demanda a elaboração de documentos bem estruturados e fundamentados, que garantem o sucesso e a segurança do procedimento de cisão.

Por isso, a contratação de uma consultoria especializada é essencial para lhe auxiliar durante esse processo, de forma a evitar, como mencionado no texto, a anulação da cisão, causando uma série de prejuízos ao seu negócio.

Desse modo, conte com a consultoria da nossa equipe, que estará sempre à disposição para te oferecer as melhores soluções e serviços para sua empresa!

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*Imagem de Yan Krukov, no Pexels.

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