A compra e venda de imóveis é um tema frequente por aqui. 

Já falamos sobre as diferenças entre a promessa e o compromisso de compra e venda, sobre cuidados na compra e venda de imóveis em geral (a chamada due diligence) e até mesmo sobre a compra e venda de imóvel em inventário.

Uma das variáveis que podem surgir no processo de venda um imóvel é a existência de contrato de locação em curso

Em regra, o locatário somente deverá desocupar o imóvel alugado quando prazo fixado no contrato se encerrar ou quando uma das partes decidir rescindir a locação. No entanto, existem algumas circunstâncias excepcionais que desafiam tal regra, e uma delas diz respeito à possibilidade de o locador colocar o imóvel à venda enquanto a locação ainda está vigente.

Neste artigo, falaremos sobre a compra e venda de imóvel alugado e os cuidados que devem ser tomados pelo proprietário/vendedor, pelo comprador interessado e, também, pelo inquilino. 

Compra e venda de imóvel com inquilino

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Compra e venda de imóvel com inquilino.

A compra e venda de um imóvel alugado é plenamente possível, porém, deve observar algumas restrições previstas na legislação. 

A Lei Federal nº 8.245/1991, conhecida como Lei do Inquilinato ou Lei de Locações, regula a locação de imóveis urbanos e estabelece, entre outras regras, os direitos e obrigações tanto dos locadores quanto dos locatários. 

Seu propósito é fomentar uma relação entre ambas as partes que seja caracterizada pela harmonia e equilíbrio, evitando qualquer possibilidade de uma parte tirar vantagem indevida da outra.

Os artigos 27 a 34 da referida lei tratam sobre o Direito de Preferência, que, em resumo, se trata da prioridade do inquilino na aquisição do imóvel alugado, caso o proprietário decida vendê-lo durante o período da locação.

A não observância do direito de preferência pode acarretar prejuízos não só para o locatário, mas também para o locador e para o comprador interessado, que pode, aliás, ser o maior prejudicado.

Vejamos, então, do que se trata o direito de preferência e quais são os principais cuidados que devem ser tomados pelas partes envolvidas na compra e venda de imóvel alugado. 

O Direito de Preferência

O Direito de Preferência consiste em assegurar ao locatário a preferência na aquisição do imóvel, quando colocado à venda.

Para melhor entender o direito de preferência na prática, vamos a alguns exemplos:

João, proprietário do imóvel X, deparou-se com uma proposta muito atrativa de venda para Fernando. No entanto, o imóvel X está alugado para Isabela até dezembro de 2023. Diante desse cenário, João poderia realizar a venda do imóvel a Fernando antes do término do período de locação acordado entre João e Isabela?

Resposta: Sim, desde que respeitado o direito de preferência. A Lei do Inquilinato prevê que, havendo uma oportunidade de venda do imóvel alugado, deve-se, primeiro, notificar o locatário, oferecendo-lhe a possibilidade de comprar o imóvel pelo mesmo preço, forma de pagamento e demais condições.

No caso do exemplo, portanto, João pode colocar o seu imóvel à venda durante o curso do prazo da locação, mas, antes de fechar o negócio, terá que, primeiramente, notificar Isabela para manifestar o seu interesse (ou não) em adquirir o imóvel. 

Caso Isabela seja devidamente notificada e decida não exercer o direito de preferência, João estará livre para vender o imóvel X a Fernando. Porém, se Isabela optar por adquirir o imóvel, exercendo seu direito de preferência, João não poderá vendê-lo a um terceiro.

Vejamos, agora, outro exemplo:

Cláudia é proprietária do imóvel Y, alugado a Marcelo, e decidiu colocá-lo à venda. Ofereceu, primeiro, a Marcelo, pelo valor de R$ 350.000,00. No entanto, Marcelo decidiu não comprar o imóvel, e Cláudia publicou o anúncio de venda para o público geral. 

Passaram-se 2 meses e o imóvel ainda não havia sido vendido pelo preço inicial. Diante disso, Cláudia optou por ajustar o valor de venda para R$ 300.000,00 e, poucos dias depois, recebeu uma proposta de um interessado em comprar o imóvel por R$ 280.000,00. Ela aceitou. Cláudia pode fechar o negócio com esse interessado? 

Resposta: O direito de preferência deverá ser observado novamente. Cláudia deverá enviar nova notificação a Marcelo, oferecendo a ele a possibilidade de adquirir o imóvel nas novas condições comerciais. Se ele recusar novamente, Cláudia poderá seguir com a venda para o terceiro interessado.

Em suma, sempre que houver alguma alteração nas condições comerciais da venda do imóvel alugado, o locatário deverá ser notificado para exercer o seu direito de preferência.

Notificação do inquilino

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Notificação do inquilino.

A notificação nada mais é que um comunicado sobre a intenção de venda do imóvel alugado e as condições do negócio, dando ao locatário a preferência para adquirir o imóvel.

Comunicar formalmente o locatário sobre a intenção de vender o imóvel é não apenas uma questão de cortesia e clareza, mas também um passo essencial para garantir que o processo seja conduzido em conformidade com as disposições legais.

O que deve constar na notificação do inquilino?

A notificação deverá conter toda as condições do negócio (art. 27, parágrafo único). Isso inclui:

  1. o preço;
  2. a forma de pagamento; 
  3. se existem dívidas ou encargos associados ao imóvel;
  4. local, data e horário em que pode ser examinada a documentação relacionada à venda;

Tudo deve ser comunicado da maneira mais clara possível, para que o locatário tenha todas as informações necessárias para decidir exercer ou não o seu direito de preferência na aquisição do imóvel

Como deve ser feita a notificação?

A notificação pode ser efetuada por meio judicial ou extrajudicial, de forma que não deixe dúvidas de que o notificado tomou ciência da notificação em determinado dia e horário (e-mail com confirmação de recebimento, por exemplo).

Nada impede que a notificação seja realizada por mais de um meio, como por carta e por e-mail, para resguardar o proprietário.

Geralmente, as imobiliárias auxiliam o proprietário na elaboração da notificação. O apoio de um advogado especializado no tema, contudo, é fundamental.

Aliás, contar com uma assessoria jurídica durante todo o processo de venda do imóvel – desde a notificação do locatário até a assinatura da escritura pública de compra e venda do bem – é essencial para garantir a segurança de todos os envolvidos.

Direito de preferência e sublocação

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Direito de preferência e sublocação.

O direito de preferência também se aplica em caso de sublocação do imóvel, cabendo, primeiro, ao sublocatário.

Imagine a seguinte situação: Bruna (locadora) alugou um apartamento para João (locatário), que sublocou o apartamento, em sua totalidade, para Felipe (sublocatário).

Nesse contexto, caso Bruna decida vender o imóvel, quem terá o direito de preferência?

Resposta: o direito de preferência será de Felipe. Assim, Bruna (locadora) terá que oferecer o apartamento para Felipe (sublocatário), para, depois, oferecê-lo a João. Se nenhum dos dois exercer o direito de preferência, ela poderá vender o bem a um terceiro, nas mesmas condições comerciais. 

Se houver mais de um sublocatário, o direito de preferência será daquele com maior tempo de permanência no imóvel. Caso o tempo seja o mesmo, a preferência será do sublocatário de idade mais avançada.

Existe prazo para o inquilino manifestar sua intenção de comprar o imóvel?

Após a confirmação de recebimento da notificação pelo inquilino, ele tem o prazo de 30 (trinta) dias corridos para exercer o direito de preferência na aquisição do imóvel (art. 28 da Lei de Locações). 

É importante observar que, durante esses 30 (trinta) dias, o proprietário fica impedido de oferecer o imóvel a terceiros, e só poderá fazê-lo após a resposta negativa do locatário. 

Prazo para desocupação do imóvel pelo locatário

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Desocupação do imóvel pelo inquilino.

Concluída a venda a um terceiro, o novo proprietário poderá optar por não continuar com a locação.

Porém, se o contrato de aluguel tiver sido firmado por prazo determinado, com cláusula de vigência em caso de alienação, e estiver averbado na matrícula do imóvel, o adquirente será obrigado a manter a locação.

Sendo possível e decidindo pela rescisão, o proprietário terá 90 dias, contados do registro da compra e venda, para notificar o locatário, e deverá conceder a ele o prazo de 90 dias para desocupação (art. 8 e § 2º).

Se esses prazos não forem observados, o contrato de aluguel permanecerá válido até o seu término. 

O aluguel pode continuar vigente após a venda do imóvel? 

O aluguel pode continuar vigente após a venda do imóvel, seja pela vontade das partes, seja por haver previsão contratual expressa.

É possível, por exemplo, que o novo proprietário tenha adquirido o imóvel como um investimento, e não pretenda residir lá. Pode ser, ainda, que ele e o locatário entrem em um acordo para a manutenção da locação. 

Mas há, também, a possibilidade de o contrato de locação possuir a chamada “Cláusula de Vigência”, prevista no art. 8º da Lei de Locações. Neste caso, e desde que o contrato tenha sido averbado na matrícula do imóvel, o novo proprietário será obrigado a manter a locação até o término do prazo.

O que acontece se eu vender o imóvel a um terceiro, sem notificar previamente o inquilino?

Caso a venda tenha ocorrido sem respeitar o direito de preferência do locatário, ele poderá tomar o imóvel para si, depositando em juízo o preço e os demais custos com a transferência da propriedade (impostos e emolumentos de cartório), desde que o contrato de locação tenha sido averbado na matrícula do imóvel com, pelo menos, 30 (trinta) dias de antecedência em relação à venda. 

O inquilino deverá tomar essas providências no prazo de seis meses após o registro da venda no cartório de imóveis (art. 33 da Lei de Locações). 

Se o contrato de locação não tiver sido averbado na matrícula do imóvel, o inquilino terá o direito de pleitear somente uma compensação financeira pelos prejuízos sofridos.

Cuidados que devem ser tomados pelo comprador interessado

Tudo o que foi falado até aqui também é relevante para a pessoa interessada em adquirir um imóvel alugado.

Isso porque, se o direito de preferência não tiver sido respeitado, o comprador pode ser o principal prejudicado.

Nesse sentido, uma das primeiras providências que devem ser tomadas pelo potencial adquirente é solicitar a matrícula atualizada do imóvel, a fim de verificar se o contrato de locação foi averbado. 

Caso positivo, ele deverá se certificar de que o vendedor ofereceu o bem ao locatário antes de fechar o negócio, garantindo a ele o direito de preferência, e se as condições comerciais foram informadas corretamente. 

Pode parecer contraditório exigir que o proprietário ofereça o bem ao locatário, já que o comprador está interessado exatamente naquele imóvel. Porém, essa é, na verdade, uma proteção

Afinal, se o direito de preferência não for observado, o locatário poderá tomar o imóvel para si, deixando o adquirente “a ver navios”. E, ainda que o adquirente possa buscar uma indenização junto ao vendedor, nada garante que todos os seus prejuízos serão integralmente compensados. 

Visitas ao imóvel

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Visita a imóvel.

É natural que, estando anunciado à venda, o imóvel seja visitado por potenciais compradores. E permitir essas visitas é uma obrigação do inquilino, que, geralmente, vem expressa no contrato de locação.

O inquilino não pode dificultar esse processo, uma vez que tal comportamento pode acarretar penalizações que vão desde a aplicação de multas até a possibilidade de despejo.

Por outro lado, o proprietário também deve ter o cuidado de combinar previamente dias e horários para as visitas, a fim de não gerar transtornos na rotina do seu locatário.

Nesse sentido, é interessante inserir cláusulas específicas sobre a visitação no contrato de aluguel, facilitando, assim, os combinados entre as partes.

Desistência da venda após a notificação do inquilino

Se proprietário, depois de notificar o inquilino para exercer seu direito de preferência, mudar de ideia e desistir de vender o imóvel alugado, ele será obrigado a compensar o inquilino por eventuais prejuízos suportados (art. 29 da Lei de Locações).

Essa medida visa coibir o uso indevido dos direitos do proprietário para forçar a desocupação do imóvel alugado.

Conclusão 

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Venda de imóvel com inquilino.

Como vimos, a venda de imóvel alugado deve ser vista com alguns cuidados, tanto pelo proprietário/locador, quanto pelo comprador interessado. 

O proprietário deve garantir ao locatário a possibilidade de exercer o seu direito de preferência na aquisição do imóvel, sob pena de ter que indenizá-lo por eventuais perdas e danos. 

Já o comprador interessado deve se certificar de que o direito foi garantido ao inquilino e se o aluguel está averbado na matrícula do imóvel, pois, se a preferência tiver sido desrespeitada, ele pode perder o bem

Se você é proprietário e deseja vender seu imóvel, ou está interessado em adquirir uma casa ou apartamento alugados, é importante contar com o apoio de um profissional especializado em transações imobiliárias para te auxiliar na análise da documentação e elaboração do contrato de compra e venda. 

Vejamos, a seguir, um resumo das informações mais importantes para cada um dos agentes envolvidos na compra/venda de um imóvel alugado:

Inquilino Adquirente  Locador

– Se exerceu direito de preferência ou renunciou a ele, a venda prossegue;

– Sem exercício ou renúncia do direito, o inquilino pode questionar a venda;

– Verificar se o contrato de locação possui cláusula de vigência e se está averbado na matrícula do imóvel;

– Se houver cláusula de vigência e estiver averbado, deve cumprir integralmente os termos do contrato de aluguel;

– Se não estiver averbado, tem a opção de rescindir a locação após 90 dias da aquisição ou manter o contrato.

– Notificar o inquilino para exercer o direito de preferência em igualdade de condições com o terceiro interessado;

– Caso o inquilino não queira comprar o imóvel, o proprietário pode vendê-lo a outra pessoa;

– Se o preço da venda foi reduzido, notificar novamente o locatário.

Se você ainda tem alguma dúvida sobre arrolamento sumário ou precisa de ajuda para um caso específico, deixe seu comentário abaixo ou entre em contato pelo nosso site.

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