Talvez o seu primeiro contato com a Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD no futebol tenha sido a leitura de alguma notícia sobre os altíssimos prejuízos impostos a um clube de futebol por um dos chamados “incidentes de privacidade”, como o vazamento de dados de torcedores por empresas parceiras.
De fato, os custos de um incidente com dados pessoais, como já salientamos anteriormente, podem ser bastante altos. O mais recente relatório da IBM aponta que o gasto médio em episódios envolvendo dados pessoais foi de US$4.24 milhões, e isso sem contar a repercussão econômica continuada de uma inevitável perda de capital reputacional.
Tudo isso pode nos deixar um pouco apreensivos e suscetíveis a cumprir a Lei “por medo”; e, assim como as crianças que cumprem, contrariadas, as ordens dos seus pais, cumprimos também dessa forma as ordens do Estado.
Mas, com exceção do “medo”, também podemos entender que cumprir a lei, na verdade, se trata de um incentivo.
Adequar-se à legislação, além de ser um dever, pode criar oportunidades concretas de geração de valor para os atores do mundo do futebol.
Nosso artigo de hoje é uma versão estendida daquele publicado na revista impressa do maior evento da indústria do futebol no continente: a CONFUT Sudamericana. Acompanhe conosco as principais oportunidades criadas pela adequação à LGPD no futebol, seja por clubes, estádios, e outros envolvidos nos Negócios no Esporte.
Índice
Revisão de procedimentos obsoletos
Veja que não é difícil perceber, até intuitivamente, que a adequação à LGPD no futebol, ou em qualquer outra área, exige organização. Cada dado pessoal coletado precisa de uma finalidade, de uma base legal que sustente essa coleta, de uma forma adequada de armazená-lo, de uma razão específica para tal armazenamento, dentre muitos outros requisitos para que seja realizado em conformidade com a legislação.
É impossível, por exemplo, elaborar um Relatório de Impacto à Proteção de Dados (o DPIA) sem conhecer os dados pessoais que circulam no clube.
É nesse momento que surge a primeira oportunidade: a revisão de procedimentos que são obsoletos.
Ter esse tipo de procedimento é muito comum. A maioria de nós lida com sistemas produtivos “fordistas”, em que há uma cadeia de produção na qual as pessoas simplesmente executam tarefas, sem haver uma reflexão sobre o todo.
Com o passar do tempo, essa cadeia de produção pode ficar obsoleta. Isso pode resultar, por exemplo, numa coleta excessiva e consequentemente desnecessária de dados pessoais. “Por que fazemos isso no clube? Porque sempre foi assim”.
A fase de mapeamento de dados pessoais, que detalhamos nesse artigo, é uma excelente forma de refletir sobre processos antigos e atualizá-los.
Como frisamos, o mapeamento permite identificar diversas informações extremamente relevantes no processo de adequação à LGPD. Nesse processo é possível identificar:
- A categoria dos titulares dos dados pessoais (atleta, demais colaboradores, torcedor, membro da comissão técnica, membro da diretoria, etc.);
- O tipo de dados pessoais coletados (nome, identidade, CPF, passaporte, e-mail, filiação, endereço, dados de desempenho de atletas, etc.);
- A forma e da duração da armazenagem de dados pessoais;
- Um eventual compartilhamento de dados com terceiros para fins de cumprimento do objeto do contrato (compartilhamento com empresa contratada para administração do programa de sócio torcedor, por exemplo);
- Documentos essenciais ao projeto;
- O fluxo dos dados pessoais.
Só com estas informações em mãos é, finalmente, possível elaborar um Relatório de Atividade de Processamento (ROPA – sigla em inglês para Record of Processing Activities).
A quantidade de informações que podem ser estruturadas sobre o “caminho” do dado pessoal dentro do clube de futebol é enorme! Mas é aí que vem o “pulo do gato”: é preciso ir além de conhecer os dados que a empresa tem; deve-se convertê-los em informação útil.
Monetização dos dados pessoais coletados
Você certamente já ouviu falar que “dados são o novo petróleo”, certo? É um clichê, mas há motivos fortes para que clichês sejam assim alcunhados. Em 2017, ficou famosa a capa da revista britânica The Economist com a mensagem de que o recurso mais valioso do mundo não era mais o petróleo, mas, sim, os dados. A revista ilustrava as grandes empresas de tecnologia como as estações petrolíferas que extrairiam riqueza desse novo ativo.
Clubes de futebol têm uma quantidade imensa desse “petróleo” nas mãos e a LGPD pode ajudá-los a utilizar esse recurso tão precioso, segunda oportunidade; utilizando estratégias para converter dados pessoais em informação útil que, respeitando a LGPD, no futebol, pode ser legalmente utilizada para gerar “dinheiro novo”.
Em um processo de adequação à LGPD no futebol é possível, por exemplo, fomentar uma inteligência de dados que não dependa da identificação individualizada das pessoas para permitir que um clube conheça, de maneira mais assertiva, o perfil do seu torcedor. Isso cria a possibilidade de estreitar e qualificar o relacionamento com a base de fãs, potencializando a geração de receitas.
Ou seja, o uso regular e legal de uma base de dados pode propiciar uma interação mais efetiva com o principal consumidor e patrimônio de um clube: a sua torcida.
Além disso, “colocar ordem na casa” traz insights e permite ajustes finos no modelo de negócios, algo essencial para lançar novos produtos e serviços. A área de inovação dos clubes certamente ficará grata!
Há um exemplo interessante sobre a criação de novas receitas e o uso de dados pessoais para oferecer novos produtos aos clientes, sobre o qual já detalhamos no nosso blog sobre Negócios no Esporte: o Galo Ads
O Galo Ads foi lançado pelo clube de futebol Atlético Mineiro em abril de 2021. Trata-se de uma plataforma que permite a veiculação de anúncios e campanhas nos canais oficiais do clube em troca de receitas. O Atlético Mineiro é o primeiro do futebol brasileiro a explorar e utilizar sua base de dados para gerar negócios.
De acordo com o Clube Atlético Mineiro, o diferencial do Galo Ads, em comparação ao Facebook Ads, Google Ads e Uol Ads, é a possibilidade de personalizar conteúdos “oferecendo ao torcedor exatamente aquilo que ele deseja”.
Como ressaltamos no blog Negócios no Esporte, o Clube Atlético Mineiro só consegue “oferecer ao torcedor exatamente aquilo que ele deseja” porque o conhece, ou seja, porque coletou dados de seus torcedores ao longo dos anos e os converteu em uma informação útil e rentável.
É uma fonte de receita nova para o clube, que parece estar rendendo frutos. Em notícia vinculada no portal GloboEsporte.com, afirma-se que o Galo Ads gerou R$1.000.000,00 para os cofres do clube em menos de dois meses.
Adequar-se à LGPD no futebol também melhora a projeção da imagem de um clube ou entidade no mercado, aumentando, com um plano de comunicação correto, a confiança dos torcedores (que, como falamos, são os “titulares dos dados pessoais” mais valiosos de um clube).
Transparência no tratamento dos dados pessoais
Um dos pilares da LGPD é a transparência; com o avanço tecnológico fica cada vez mais difícil fazer parte da vida em sociedade sem fornecer dados pessoais. E, já que parece ser inevitável, o cidadão certamente tenderá a procurar consumir produtos e serviços de empresas que são transparentes quanto ao uso dos dados pessoais e que possam oferecer um mínimo de segurança de que os tratamentos estão sendo realizados de forma regular.
Um clube de futebol que esteja em linha com a LGPD pode explorar o fato de que realiza o tratamento correto dos dados pessoais no plano de comunicação para reforçar a confiança do torcedor.
A melhoria da reputação também pode atrair patrocinadores premium que só operam com quem tem políticas claras e efetivas de segurança de dados.
Mencionamos no artigo sobre a responsabilidade civil na LGPD que há responsabilidade solidária entre controlador e operador, possibilitando que o titular de dados pessoais acione quaisquer uma das partes envolvidas em um tratamento de dados pessoais para obter a indenização devida.
Como frisamos naquela oportunidade, deve-se realizar uma extensa e cuidadosa diligência ao contratar fornecedores e prestadores de serviço já que uma empresa em desconformidade com a LGPD pode trazer riscos àquela e prejudicar toda uma cadeia de titulares de dados pessoais.
É por isso que a questão da reputação é importante também perante a outras empresas.
No mais, evidentemente, investir em segurança leva à instrumentalização apropriada para remediar eventuais incidentes. A exigência legal relacionada à segurança não se limita à prevenção de um eventual incidente de dados pessoais, mas também, e especialmente, se refere às medidas mitigadores relacionadas à ocorrência desse incidente.
Conclusão: as oportunidades trazidas pela LGPD no futebol
Todas essas medidas devem ser tomadas não somente para fins de adequação à lei, mas para fins de proteção aos ativos do clube.
Feita essa demonstração, com certeza você concorda conosco de que a adequação à LGPD no futebol pode significar uma excelente oportunidade para um clube, não é mesmo?
Conte conosco para que possamos te ajudar a encarar a LGPD como a oportunidade que ela é. Vamos juntos investir nesse “novo petróleo”.
Se gostou do conteúdo, deixe também uma avaliação no Google. O seu feedback é muito importante pra nós!